Esta frase, da autoria do Velho do Restelo, foi fotografada pelo Miguel, em Monsanto, e diz: «Quem vê Faces e Instas não vê corações apenas falsas emoções!».
Parafraseando o ditado «Quem vê caras não vê corações», o autor substitui «caras» pelo seu sinónimo em inglês, «Faces», para se referir ao Facebook, a que acrescenta o Instagram, reportando-se a duas redes sociais muito utilizadas. E conclui que os corações que não se veem são substituídos por falsas emoções. Trata-se, uma vez mais, de crítica das redes sociais (uma outra frase do mesmo autor publicada neste espaço também criticava o Facebook).
Penso que todos sabemos que as emoções partilhadas nas redes sociais são falsas e não temos sequer a ilusão de que poderão ser verdadeiras. Sabemos bem, como diz o poeta Vasco Gato, que «por ti aprendi como as coisas se tocam». É com os outros que aprendemos a tocar o mundo.
Porém, gostamos de alimentar a ilusão de um mundo paralelo, que teimamos em espreitar e onde tudo parece mais do que na vida – as vidas dos outros são muito mais perfeitas do que as nossas, mas a violência também é muito mais feroz do que a que enfrentamos no dia a dia.
Efetivamente, as fotografias ou as publicações que partilhamos no Facebook e no Instagram, partilhando, assim, também, um pouco do que vivemos e do que vamos fazendo, são pedaços dispersos da vida, momentos em que fomos felizes ou em que estivemos num local de beleza. É, pois, se analisarmos de forma crítica, uma coleção de bons momentos. Mas, para quem vê essas imagens, parece que estamos sempre em festa e que a vida é o epíteto da perfeição e da felicidade.
De igual modo, essa falta de enquadramento estimula a coragem daqueles que, sendo mais fracos ou mais revoltados, nunca seriam capazes de fazer uma crítica numa situação em que estivessem cara a cara com outros, mas que, escondidos atrás do escudo protetor do seu computador, sentem fôlego para agredir, para criticar, para abusar da liberdade dos outros. Diz Rodrigo Guedes de Carvalho em Jogos de Raiva: «a internet e as redes sociais não inventaram necessariamente novas pessoas, que são, ai que horror, isto e aquilo. As pessoas sempre foram o que são hoje, só que estavam escondidas do nosso olhar e perceção, o que acontece é que a internet permite que se mostrem, que consigam atingir-nos lá do fundo das suas cavernas, que saiam das tocas para nos golpear. Ter o mundo todo à porta é ficar mais vulnerável, é um preço lógico»…
E, realmente, há um preço a pagar por ter, como diz o autor, «o mundo todo à porta». Temos o lado bom do mundo e temos o mau.
Gostamos, sobretudo, do lado bom. De poder ter acesso rápido a um mundo de possibilidades, de ver que os outros gostam daquilo que publicamos e, por conseguinte, gostam de nós (numa interpretação que sabemos ser demasiado simplista mas que serve bem o nosso ego). Importa, no entanto, não esquecer a verdade – a verdade daquilo que nos rodeia e a verdade de nós próprios. Diz Rainer Maria Rilke, em Cadernos de Malte Laurids Brigge: «Não peças a ninguém que fale de ti, nem mesmo com desprezo. E quando o tempo passar e tu notares que o teu nome circula entre os homens, não o tomes mais a sério do que tudo o que encontras na sua boca. Pensa que ele se perverteu, e desfaz-te dele. Adota outro, qualquer outro, pelo qual Deus te possa chamar a noite. E esconde-o de todos».
Só com esta consciência teremos a medida exata de quanto valem as redes sociais. Diz Clara Ferreira Alves: «De certo modo, o que os anónimos sem um talento particular fazem é isto, lutar pela relevância, pelo papel principal. Inserir-se na narrativa do Instagram e do Facebook, dar largas ao exibicionismo e ao escândalo, conferir à mediania uma dimensão fugaz no espaço e no tempo. Nunca ganharão a eternidade. O ácido digital se encarregará se os dissolver.» A vida vive-se fora das redes sociais, vive-se cá fora, na rua.