Superadas as ameaças das greves dos camionistas, que o Dr. Santos resolve com souplesse de diplomata, o país político preparou-se para mais uma pugna eleitoral: os partidos da ‘geringonça’ acenam com as bandeiras dos sucessos, mas a oposição diz que foi pouco; o povo queixa-se da miséria dos salários, mas o primeiro-ministro esclarece que o mal está no salário médio, que continua colado ao mínimo. Será que o Dr. Costa lê esta coluna?
A penúria é mais evidente na composição dos carros dos supermercados, onde enlatados e biscoitos substituíram a carne e o peixe, e nas bombas de gasolina, onde os mostradores mostram cada vez mais a cifra de 10 euros. O discurso oficial garante que os portugueses estão a viver melhor, mas as dificuldades impõem-se… às pessoas e aos carros.
Apesar disso, as praias mantiveram a afluência de sempre e um canal de televisão tentou, mesmo, desvendar o milagre. À pergunta «Sente a crise?», a resposta repetia-se: «Muito!». Mas, ao pedido de explicação «Então, como consegue fazer férias?», uma das interpeladas respondeu candidamente: «A gente compensa noutras coisas». Em quais? «Na alimentação!». Eis o espelho da mais absurda inversão de prioridades, onde é mais importante o que se mostra aos outros do que aquilo que se é na realidade.
Infelizmente, nem tudo pode ser resolvido com o sentido prático daquela senhora, Passos Coelho que o diga. Mesmo acusado da malvadez de ter ido ‘além da troika’, ainda ganhou nas urnas – mas alinhamentos partidários inesperados acabaram por impor uma ‘geringonça’ que, para começo de conversa, decretou o ‘fim da crise’, e o discurso oficial informou que estávamos outra vez ricos. Ninguém percebeu como, ou porquê, mas também não importava. Seguidor dos conselhos de Maquiavel, o Dr. Costa não esquece que os povos tendem a preferir quem promete a abastança aos que pedem sacrifícios.
Os partidos do poder atiram à cara dos opositores os indicadores económicos onde houve melhorias, mas a poupança das famílias continua no GRAU ZERO. O pessoal até pode continuar a encher as praias e os concertos musicais, mas, no posto de abastecimento… DEZ EUROS! Não são as bombas de gasolina que estão secas, são os bolsos!
As eleições estão à porta – oxalá as férias não tenham sido feitas à custa do apertar da barriguinha –, os debates têm sido brandos, mas pode acontecer que ainda haja berraria. Tudo estará em discutir, ou não, a verdade dos números e das palavras, e as reais diferenças de projeto, de objetivos e de estratégias.
Assim ou assado, haverá pão e circo… mais circo que pão, porque as ‘doações’ dos empresários estão agora muito vigiadas. Nas promessas dos últimos dias é que virá pão com fartura… quem sabe se até brioches.
P. S. – Recomeçaram as aulas. Nas reportagens televisivas vi desfilar mais de vinte professoras e professores, inesperadamente aprumados e bem vestidos. Agora, ficamos à espera que mostrem que as mudanças não se ficam pela vestimenta: o país precisa que a classe dos professores volte a ser respeitada.