Trump e o whistleblower

Queixa revela alegado encobrimento do telefonema entre Trump e Zelensky por parte da Casa Branca.

A desclassificação da queixa explosiva do denunciante anónimo que revelou pressões de Donald Trump sobre o seu homólogo ucraniano está a abalar os corredores de Washington. Enquanto as movimentações para o impeachment se intensificam, o Presidente dos Estados Unidos defendeu a pena de morte para quem colaborou com o whistleblower.

«No curso dos meus deveres oficiais, recebi informações de vários responsáveis do governo dos Estados Unidos de que o Presidente está a usar o poder do seu cargo para solicitar interferência estrangeira nas eleições», diz o whistleblower na queixa, tornada pública esta quinta-feira e enviada ao Congresso. Ou seja, o denunciante assume que obteve estas informações de várias fontes no seio da Casa Branca, não tendo presenciado a maior parte dos eventos.

Em causa está o telefonema entre Trump e Volodomyr Zelensky, Presidente ucraniano, e o encobrimento da chamada por parte dos seus aliados na Casa Branca. Na altura, Trump pediu a Zelensky para investigar podres de Joe Biden, seu possível rival nas eleições de 2020, e do seu filho, que foi administrador de uma petrolífera ucraniana. «Seja o que for que possa fazer, é muito importante que faça o possível», pediu Trump a Zelensky, segundo a reconstituição do telefonema publicada na passada quarta-feira.

Note-se que a chamada telefónica ocorreu a 25 de julho, um dia depois da audiência de Robert Mueller, antigo diretor do FBI, nomeado para liderar a investigação sobre a interferência russa nas eleições de 2016, na qual Trump escapou às acusações de conluio com a Rússia.

«Estou também preocupado que estas ações constituam um sério risco para segurança nacional dos Estados Unidos», disse o whistleblower, que realçou que o círculo próximo de Trump movimentou-se para «fechar a sete chaves» a transcrição do telefonema, mal se aperceberam do conteúdo do diálogo. «Compreenderam a gravidade do que se sucedeu», argumenta o denunciante.

A versão eletrónica palavra a palavra da transcrição foi removida da base de dados onde normalmente são depositados estes documentos e transferida para o sistema onde são armazenadas as informações sensíveis em termos de segurança nacional, segundo a queixa.

Não tendo o autor da denúncia ouvido a conversa nem lido a transcrição quando apresentou a queixa, a sua descrição, argumenta o Washington Post, é «estranhamente precisa».

Ameaça à segurança nacional

Só que o caso vai para lá do diálogo por telefone entre os dois chefes de Estado. Segundo o denunciante, o advogado pessoal de Trump, Rudolph Giuliani, encontrou-se diversas vezes com conselheiros de Zelensky para tentar obter informações sobre Biden e o filho. O whistlteblower relata, inclusive, que Giuliani atravessou o Atlântico para se deslocar a Madrid para um encontro com um conselheiro presidencial ucraniano, no dia 2 de Agosto. De acordo com as fontes do whistleblower, o encontro foi a sequência «direta» do telefonema entre Trump e Zelensky.

Em reação à queixa, Trump, que tem acusado os democratas estarem a fazer uma «caça às bruxas», parece defender a pena de morte para quem colaborou com o denunciante. «Quem foi a pessoa que deu a informação ao whistleblower? Porque isso é próximo de um espião. Sabem o que fazíamos com os espiões e as traições nos velhos tempos em que éramos espertos, certo? Costumávamos lidar com isso de uma forma um pouco diferente de hoje», assinalou Trump num evento privado em Nova Iorque, numa gravação obtida pelo Los Angeles Times esta quinta-feira.

Pensa-se que o whistleblower é um agente da CIA, segundo noticiou o New York Times esta quinta-feira. A Casa Branca descobriu que um agente das secretas norte-americanas tinha apresentado alegações contra Trump sobre as suas negociações com a Ucrânia, enquanto a denúncia oficial do processo decorria.

O agente terá partilhado as informações com o advogado de topo da CIA através de um processo anónimo. Com isso, o advogado transmitiu as preocupações do agente para o Departamento de Justiça.

O inspetor-geral das secretas, Michael Atkinson, nomeado por Trump, ouviu várias testemunhas sobre a queixa e concluiu que poderia haver razões para a acreditar que Trump solicitou ilegalmente a interferência de Zelensky e que a sua alegada má conduta criou um risco de segurança nacional, segundo um memorando do Departamento de Justiça, citado pelo New York Times.