Soube deles, primeiro, através de amigos comuns – «o António já é bisavô!» –, vejo-os agora a levar os bisnetos à escola, no começo do novo ano escolar. São os ‘jovens bisavós’ do século XXI.
Que se passou? Várias coisas, com um ponto em comum: condições de bem-estar, físico, anímico e económico, que favoreceram a missão de ‘pronto-socorro’ para as três gerações que lhes sucederam. A questão não é apenas logística, é, sobretudo, financeira.
O bem-estar de 2019 remete para os anos 60, quando os filhos da classe média foram convocados para darem resposta a um crescimento económico sem precedentes, patente num PIB que, em vários anos da década dourada, superou a mítica fasquia dos 10%. Não foi uma opção política, nem um favor da classe possidente, foi a necessidade que obrigou os donos das empresas a irem caçar fora da coutada familiar, que sempre tinha dado para as encomendas.
Foi então que o país descobriu um elevador social que, ainda nos tempos de Salazar e Caetano, podia tomar passageiros na Brandoa, ou em Perafita, para os levar até às salas dos conselhos de administração das maiores empresas, quando não a gabinetes ministeriais. Uma revolução!
Quatro décadas depois, veio a crise e a janela das oportunidades fechou. Resta um único elevador, para uso exclusivo dos partidos políticos, com uma fila de ‘jotinhas’ à espera de oportunidades para mostrarem que merecem lugar na cabina.
O entendimento do ‘fenómeno’ da emergência dos bisavós exige a caracterização de uma faixa etária abençoada que, como alguém observou certeiramente, «nasceu depois da guerra e antes da sida».
Licenciaram-se, casaram e ficaram bem na vida em poucos anos, cumprindo o sonho dos pais: ter um filho doutor… que era, então, o livre-trânsito para a saída do purgatório dos servos, onde, por séculos e séculos, tinham penado os ancestrais.
Com este balanço, muitos foram avós aos cinquenta e alguns foram bisavós aos setenta… depois de um neto os ter brindado com o rebento que, agora, os leva à quarta abertura das aulas.
Quanta coisa mudou desde que, há sessenta e tal anos, penteadinhos e de batinha branca, deram entrada na sua escola primária, onde os esperava um Mestre austero, de régua na mão! As famílias eram, então, geralmente numerosas, e os alunos tanto podiam ser os primeiros filhos de um jovem casal como os últimos de uma ninhada de dez ou doze, podendo acontecer que os mais velhos já estivessem casados e com filhos, gerando a insólita situação de haver tios mais novos que os sobrinhos.
Quando isso acontecia, os avós eram uns velhinhos, cujas rugas espelhavam o peso da idade, dos anos de trabalho sofrido e das dores reumáticas.
O mistério dos ‘jovens bisavós’ é este: os anciãos de há sessenta anos cederam o lugar a mulheres e homens saudáveis, que respiram vitalidade e exibem o sorriso feliz de quem, no outono da vida, ainda é a âncora da família. Começaram por ser para os pais, foram, a seguir, para filhos e netos, e são, agora, para os bisnetos.