Para Nicolas Sarkozy, aceitar as diferenças não pode ser uma ideia aplicada em apenas alguns setores da sociedade. Durante a conferência Inspiring Hungary, organizada pela Agência de Promoção do Investimento Húngaro (HIPA), o antigo Presidente francês falou sobre as diferenças existentes na Europa, a falta de tolerância para as aceitar e as crises de liderança que se vivem hoje em dia.
Durante o debate com o ex-presidente do Governo espanhol, José María Aznar, Sarkozy – que tem ascendência húngara – começou por elogiar a terra dos seus antepassados, enaltecendo o seu potencial político-económico. «Gosto da Hungria não só porque o meu pai era húngaro, mas porque o seu povo é corajoso. Até 1956, ano da revolução húngara, a Europa deixou-vos sozinhos e vocês resistiram. A Hungria é a ponte entre a Europa do Leste e Ocidental, entre a Europa do Leste e a Europa do Sul, entre a Rússia e o resto do continente. É um local estratégico, profundamente europeu», afirmou o político francês durante a conferência que encerrou os encontros, que decorrerram no dia 1 de outubro, em Budapeste.
Esta frase deu o mote para abordar a questão das diferenças dentro do Velho Continente. O Governo da Hungria tem sido alvo de duras críticas por parte dos líderes europeus devido às suas políticas nomeadamente na questão da integração de refugiados. Além disso, o facto de, em março de este ano, o Fidesz se ter autossuspendido do Partido Popular Europeu (PPE) levou a que muitos especulassem sobre a continuidade da Hungria na União Europeia. Apesar do clima de tensão, no final de setembro, num congresso do Fidesz, Viktor Orban fez questão de deixar claro que a Hungria não tenciona seguir o exemplo daquele país: «Somos um membro da União [Europeia] e vamos continuar a sê-lo».
Falando sobre o primeiro-ministro húngaro e as medidas pouco populares do seu Governo, Nicholas Sarkozy fez questão de frisar que as diferenças dentro da União Europeia têm de ser aceites. «Estar na mesma União não significa que tenhamos de ser todos iguais. Temos diferenças históricas. Temos de ter noção de que os milhões de europeus não são iguais e que é necessário manter o respeito pelas diferentes formas de pensar».
«Este não é o momento para cisões. O resto do continente tem de perceber que a Europa Central e de Leste tem as suas particularidades e que a Hungria é essencial porque consegue comunicar com todos», acrescentou.
Saídas e entradas
E se, por um lado, é preciso aceitar as diferenças, por outro é necessário reconhecer, diz Sarkozy, que o mundo vive uma «crise de liderança», que está a criar cada vez mais divisões. Quando falava sobre o Reino Unido, o antigo presidente francês acabou por dizer que Boris Johnson, primeiro-ministro britânico, «é pior que Donald Trump». Isto porque, para Sarkozy, o Presidente dos EUA «não tem qualquer ideologia, o que significa que podemos conversar com ele. O primeiro-ministro britânico é um idealista», explicou. No entanto, Sarkozy não se coibiu dizendo ainda que, face a fenómenos como estes, «nunca os líderes mundiais foram de tão má qualidade e nunca o mundo precisou tanto de uma liderança forte».
Sarkozy foi mais longe e afirmou que a saída do Reino Unido da União Europeia «não é apenas um erro, é uma loucura». «Daqui a uns anos, o Reino Unido estará acabado, oiçam o que eu vos digo. O Brexit vai ser um problema para todos, não há estratégia nenhuma por detrás da saída», acrescentou o político francês.
«O que interessa se é um Brexit duro ou um Brexit leve? O que interessa é que vai acontecer. Eu não queria a desintegração deste continente», confessou Sarkozy.
O ex-Presidente francês abordou ainda a questão da entrada de novos países na União Europeia: «Não são apenas os países que têm de estar prontos para integrar este grupo, a própria União tem de se preparar para receber novos membros, com visões diferentes. O seu funcionamento não pode ser o mesmo se tiver seis ou 36 membros». Recorde-se que no início deste mês foi noticiado que a União Europeia vai abrir conversações oficiais sobre a adesão de dois países balcânicos, a Macedónia do Norte e a Albânia.
Euro e os desafios que se adivinham
Durante a sua intervenção, José María Aznar disse que não conseguia imaginar Espanha e a Europa sem o euro. O ex-presidente do Governo espanhol defendeu que, apesar de ao início não ter sido encarado com bons olhos, o euro é uma história de sucesso, com a moeda europeia a ser, atualmente, uma das mais fortes do mundo.
Sarkozy é mais cauteloso e alerta para a possibilidade de existir uma nova crise financeira e para a necessidade de pensar a longo prazo: «Temos de começar a olhar para o futuro. O dinheiro vai começar a desvalorizar e temos de começar a preparar-nos para a ideia de que vamos ficar com saldo zero ou negativo». Para prevenir um cenário mais negro, o antigo Presidente francês diz que, agora, «a tarefa dos Governos é investir em infraestruturas, para que estas ganhem valor. Numa altura em que o dinheiro começa a ter um valor cada vez mais baixo, essa deve ser a aposta».
Nicolas Sarkozy defendeu ainda que a Europa e o resto do mundo têm de começar a olhar mais para África e a melhorar as relações com este continente. «Temos de perceber como devemos ajudar os países africanos a desenvolverem-se, a lidar com a pobreza, as questões migratórias e outros problemas. O futuro passa por África. A Nigéria, por exemplo, em breve terá mais habitantes que os EUA», referiu.