O empresário Domingos Névoa apresentou queixa contra João Serino Rodrigues, o filho único do seu sócio, Manuel Rodrigues, imputando-lhe um crime de difamação, porque o jovem acusa Névoa de ter “desviado” em proveito próprio 850 mil euros da Bragaparques, enquanto Névoa diz ter sido tal operação contabilística relativa à devolução da quantia que emprestara à mesma empresa, o que está tudo documentado, pelo que se tratarão de “falsas declarações”, que o afetam a nível pessoal, familiar e profissional, daí o processo.
João Serino Rodrigues, que curiosamente é afilhado de Domingos Névoa, durante uma entrevista à revista Sábado, a propósito do diferendo pela divisão do universo empresarial da Rodrigues & Névoa, “ter detetado 850 mil euros em falta na Bragaparques”, que terão ido parar a uma conta pessoal de Névoa, além de que “o senhor Domingos através de uma sociedade dele, Notablebalcony, fez a venda da área ambiente da Bragaparques (Geswater e Criar Vantagens), no dia 10 de julho, sem nenhum pagamento e sem ir a conselho”, uma acusação que Névoa, através do seu advogado, Raposo Subtil, não deixou passar em claro.
A posição expressa por João Serino Rodrigues, comungada pelos pais, Manuel Rodrigues e Fernanda Serino, foi já confirmada pelo porta-voz do Clã Serino Rodrigues, referindo igualmente que “o senhor Domingos movimentou indevidamente dinheiro das empresas”.
Em causa estará assim “o valor das participações sociais de que a Bragaparques era titular no capital das sociedades Geswater e Criar Vantagens, que o senhor Domingos Névoa e a senhora Florinda Névoa passaram para a empresa detida pela descendência do senhor Domingos Névoa, Notablebalcony, a 10 de julho de 2019”, mas “de que o senhor Manuel Rodrigues apenas tomou conhecimento uma semana depois”, ainda segundo o porta-voz.
Alias, o próprio Manuel Rodrigues, que é também vice-presidente do Sporting Clube de Braga, chegou inclusivamente a propor “a destituição com justa causa do administrador Domingos Névoa”, por esse mesmo motivo, mas acabaram ambos os sócios por fazerem um acordo, Névoa para “pacificar” a empresa e Rodrigues deixando essas contas para depois, até por reiterar que “o senhor Domingos movimentou indevidamente dinheiro das empresas”, com acusações de “movimentações bancárias” extensivas à mulher de Névoa.
“Quando o senhor Manuel Rodrigues fizer a proposta para comprar a Bragaparques, vai descontar” esse valor e vai também descontar o valor dos movimentos bancários feitos pelo senhor Névoa e mulher”, salientou o assessor de comunicação de Manuel Rodrigues.
Acerca da validação de todos os atos de gestão de Névoa, por parte de Manuel Rodrigues, ao mesmo tempo que reclama tais quantias, o porta-voz de Rodrigues explica que “o que agora há a fazer é, por questão prática, reconhecer o valor dos ativos transferidos, mais o montante financeiro, descontar ainda do valor de compra por parte de Manuel Rodrigues”.
“Quando o senhor Domingos Névoa, e família, venderem os seus 50%, eles valerão x menos y, ou seja, o valor da proposta menos o valor das empresas e dos 850 mil euros”, acrescentou o assessor, esclarecendo a posição de Manuel Rodrigues e Fernanda Serino.
Rodrigues quer comprar Bragaparques
O empresário Manuel Rodrigues refere querer comprar a outra da metade do capital social da empresa Bragaparques, reiterando as acusações contra o sócio, Domingos Névoa, de “desvios”, mais concretamente que “movimentou indevidamente dinheiro das empresas”.
Ainda de acordo com o seu porta-voz, “o senhor Manuel Rodrigues não quer vender, mas sim comprar, a empresa Bragaparques, aliás, o senhor Domingos Névoa não tem qualquer contrato, assinado pelo senhor Manuel Rodrigues para a venda” daquela mesma empresa de estacionamento subterrâneo, terceira maior do país, com treze parques em sete cidades.
“O senhor Manuel Rodrigues, juntamente com a sua mulher, mantém a propriedade de 50% do capital da Bragaparques, hoje, amanhã, segunda-feira… e por aí em diante”, diz.
“O senhor Manuel Rodrigues não vai abdicar de ficar com a Bragaparques e os próximos 120 dias são uma oportunidade para ele ficar com a totalidade da empresa, referindo que decorridos esses quatro meses, “se no final desse período, se não houver entendimento, procurar-se-ão outras vias, designadamente as judiciais, tendo em vista garantir que a propriedade total da empresa fica com o senhor Manuel Rodrigues”, salientou o assessor.
Névoa diz que Rodrigues validou contas
Esta posição de Manuel Rodrigues segue-se por sua vez à reação de Domingos Névoa, na sequência de uma entrevista de Rodrigues à revista Sábado, um dia antes do acordo, tendo Névoa considerado então que “afinal, não existiam, nem existem, quaisquer atos ou factos irregulares no seio do grupo que partilhei com o senhor Manuel, apesar do alarme e das notícias falsas que foram difundidas com objetivos questionáveis, mas que os Tribunais julgarão no futuro”.
Domingos Névoa sustenta assim, na sua primeira reação pública aos diferendos com o sócio, que “como resulta do acordo assinado por todos os membros da minha família e da família do senhor Manuel Rodrigues, ficou já definitivamente reconhecida a validade de todos os contratos anteriormente celebrados, tal como todos os movimentos financeiros e atos da administração das empresas”.
Tal como o i e o Sol têm noticiado, Névoa e Rodrigues decidiram separar os negócios e as empresas, pelo que havia a passar de um para o outro as respetivas metades das ações da Bragaparques, mas os diferendos começaram logo com a avaliação da empresa, porque Rodrigues diz valer 210 milhões de euros e Névoa entende que vale somente 130 milhões.
Por isso os dois sócios optaram por uma solução salomónica: quem oferecesse mais, no caso Rodrigues, tinha a preferência de primeiro dispor de meio ano para pagar metade do que avaliara (105 milhões), a fim de ficar com os outros 50 por cento da Bragaparques, mas caso não conseguisse pagar nesse prazo, passaria Névoa a ter o mesmo período para comprar a Rodrigues a metade deste, ainda segundo a sua avaliação (65 milhões de euros).
Manuel Rodrigues nunca conseguiu comprar a metade de Névoa, porque em meados de dezembro do ano passado estava impedido judicialmente de realizar o negócio, por haver um processo em tribunal, interposto pela DST, a providência cautelar que questionava a cisão da empresa de águas, participada pela Bragaparques, pelo que a escritura “seria um ato inútil e ilegal”, segundo Névoa, considerando a sua marcação como “uma encenação”.
“Os representantes de Domingos Névoa presentes em 17 de dezembro de 2018, munidos de todos os poderes, entregaram a certidão de registo comercial da Bragaparques e outros documentos, demonstrando que não era possível a formalização dos atos artificialmente agendados, constituindo uma encenação, Domingos Névoa não quis compactuar com essa espécie de circo”, segundo alguns dos seus colaboradores mais próximos.
“Aliás, Manuel Rodrigues concordou, até porque o prazo foi suspenso em seu benefício, durante vários meses, conforme atestam documentos assinados”, dizem as mesmas fontes próximas de Domingos Névoa.
O caso mudou de figura quando em 23 de abril deste ano, Domingos Névoa conseguiu remover a impossibilidade de venda da empresa das águas, por acordo que alcançou com a DST, momento a partir do qual Manuel Rodrigues passou a ter condições legais para comprar a Névoa 50% da Bragaparques, o que não fez, por não ter capacidade financeira para pagar os 105 milhões a Névoa, que em face dos prazos contratuais entre ambos e às sucessivas prorrogações esgotadas, passou a ter direito exclusivo de por sua vez comprar a Rodrigues a metade deste da Bragaparques, segundo a avaliação de Névoa (65 milhões).
“Após estarem reunidas por Domingos Névoa todas as condições, para Manuel Rodrigues comprar então a Névoa a metade da Bragaparques, Rodrigues começou logo a bloquear a atividade normal da empresa, com pedidos de destituição e julgamentos de caráter do sócio Domingos Névoa”, segundo fontes ligadas a Névoa.
Administrador fora das famílias
Manuel Rodrigues já confirmou ao i a existência do acordo, salientando que “deu-se uma alteração na composição para o conselho de administração da Bragaparques, passando a mesma para quatro elementos”, explicando que até aqui “bastavam as assinaturas de dois administradores para vincular a empresa: na prática, dois administradores podiam obrigar a sociedade, sem a intervenção e no limite, sem conhecimento, do presidente do conselho de administração”.
“Agora, já não é assim: dois administradores já não obrigam a sociedade, na prática, isto significa haver paridade na representação acionista da Bragaparques no seio do conselho de administração”, acrescenta Manuel Rodrigues, salientando que “esta paridade obrigará a decisões por consenso”, o que “é uma boa notícia para a empresa, tendo agora no seu órgão executivo uma adequada representação do capital social, com dois administradores nomeados por cada uma das partes”.
“A composição da administração da Bragaparques mudou: eu estava como presidente do conselho de administração e o senhor Domingos Névoa e a sua esposa, Florinda Névoa, eram ambos administradores”, como começou por dizer Manuel Rodrigues de Sá Serino.
“Até aqui bastavam as assinaturas de dois administradores para vincular a empresa, o que era uma situação que não podia continuar por mais tempo, porque havia um desequilíbrio da representação acionista no conselho de administração”, disse Manuel Rodrigues.
Com o novo acordo, Manuel Rodrigues obteve a paridade nas decisões da Bragaparques, de nova composição: Rodrigues e Luís Teles (gestor da confiança de Rodrigues, que foi dez anos presidente do clube bracarense ABC), Domingos Névoa e o seu filho mais velho, Bruno Névoa, sendo a primeira vez que há um administrador já fora de ambas as famílias.
Rodrigues satisfeito com paridade
Para Manuel Rodrigues, o acordo alcançado com Névoa “é uma boa notícia”, já que “esta paridade obrigará a decisões por unanimidade, a Bragaparques tem a partir de agora no seu órgão executivo uma adequada representação do seu capital com dois administradores nomeados por cada uma das partes”.
“Domingos Névoa não viu qualquer problema na alteração do conselho de administração, de três para quatro elementos – pois a sua atuação será de mera gestão – contrariamente àquilo que Manuel Rodrigues pretendia, que era precisamente alterar a atual composição a seu favor, com a substituição de Domingos Névoa pela sua esposa, em clara e flagrante contradição com os argumentos que utilizara para questionar as composições de 2+1, mas o que realmente queria Manuel Rodrigues era passar de 2-1 para 1-2”.
“Estranhamente, optou por não indicar nem a sua mulher, nem o seu filho, para o conselho de administração, mas sim uma pessoa externa a ambas as famílias, enquanto Domingos Névoa substituiu a esposa pelo filho mais velho”, de acordo com os círculos mais ligados a Domingos Névoa.
Névoa também quer Bragaparques
“Resgatei uma empresa que ajudei a construir durante mais de 25 anos, pensando sempre nos interesses coletivos, mas não prescindirei de, decorridos os quatro meses previstos no acordo, requerer em tribunal a execução específica da partilha, a promessa de venda da Bragaparques para cumprimento da proposta que apresentei”, salienta Domingos Névoa.
Para Domingos Névoa, que pela primeira vez se refere publicamente ao diferendo com Manuel Rodrigues, “depois de ter proposto que o litígio existente sobre a concretização da partilha da Bragaparques fosse resolvido por um tribunal arbitral, o que não foi aceite pelo senhor Manuel Rodrigues, para defesa da estabilidade da empresa e dos direitos dos seus trabalhadores, aceitei celebrar um acordo”.
Conforme o acordo agora firmado, entre ambas as partes, “no caso de, no termo do prazo de 120 dias não haver acordo quanto à aquisição por uma contraente [Domingos Névoa] à outra contraente [Manuel Rodrigues] de participações no capital social da Bragaparques que cada é titular, os primeiros contraentes [Domingos Névoa e esposa, Florinda Névoa] deverão intentar, no prazo subsequente máximo de 30 dias, junto do tribunal judicial competente, a ou as ações judiciais necessárias ao exercício dos direitos que se arrogam titulares para efetivar a respetiva partilha, seja qual for a sua natureza e extensão”, refere.
O mesmo acordo refere ainda “podendo os segundos contraentes [Manuel Rodrigues e esposa, Fernanda Serino] deduzir, nessa mesma ação, um pedido reconvencional para o exercício dos direitos que se arrogam titulares, seja qual for a sua natureza e extensão, ou intentar uma ação autónoma para esse efeito, no mesmo prazo, caso em que assistirá aos primeiros [Domingos Névoa e Florinda Névoa] o mesmo direito a reconvir, ficando assim todas as contraentes com iguais direitos processuais”.