Filhos que vivem em redomas

Os pais não devem interferir nas amizades dos filhos. É importante que os deixem viver livremente com os colegas e professores. 

Todos os pais querem o melhor para os seus filhos. E é natural que pensemos que o melhor é aquilo que seria melhor para nós ou que protegê-los – como fazíamos quando eram pequeninos – os afastará dos males do mundo e os fará crescer felizes e em segurança. Em parte será assim, mas há cada vez mais pais que exageram.

Há pais que adorariam, como uma professora dizia outro dia, que a escola tivesse só meninos exatamente iguais aos seus filhos. Há também pais que escolhem as amizades dos filhos e que os proíbem de se dar com certos amigos e incitam a amizade com outros que consideram melhores. Ainda há pouco tempo soube de uma mãe que proibiu o filho de se dar com um amigo porque considerava que este tinha «má figura». Há que dizer que o menino de «má figura» é dos mais bem educados que já vi, pelo menos com adultos, e de resto é um menino como qualquer outro. Em contrapartida, o outro menino parece vingativo, chegando a incitar à violência contra aqueles de quem não gosta. Curioso: parece precisamente o reflexo dos valores que aprendeu em casa.

Este é só um exemplo. Mas não são poucos os pais que tentam controlar tudo na vida dos filhos, desde as amizades até ao que se passa na escola, a relação com os professores, o que fazem no recreio. Como sabemos, as escolas têm muitas vezes alunos mais complicados, por vezes surgem desacatos, dentro e fora das salas de aula, as crianças e adolescentes são diferentes entre si, o que é normal e reflete o mundo e a vida real. É na diferença que aprendemos, que nos desenvolvemos, que nos enriquecemos. Ter escolas cheias de crianças iguais aos nossos filhos seria uma pobreza. Além de que os nossos filhos – ao contrário do que os progenitores possam pensar – também terão os seus defeitos. Fazê-los crer que são seres exemplares e que todos os outros são piores não é de todo benéfico e só os tornará arrogantes, sem capacidade de olharem para si próprios e de se avaliarem e às situações que ocorrem, com clareza.

Tal como os pais não devem imiscuir-se nas amizades dos filhos –, até por não terem dados suficientes para o fazer e por não ser essa a sua função –, também é importante que os deixem viver livremente com os colegas e professores sem interferir nestas relações, a não ser que seja uma situação claramente perigosa ou complicada. Os filhos devem aprender a defender-se sozinhos, as escolas deverão ter autonomia para resolver os seus problemas sem intervenções constantes das famílias – por vezes muito pouco dignas –, e os filhos deverão poder crescer sem esta sombra e o veneno que muitas vezes os pais transportam e descarregam à primeira ameaça.

Como podem os filhos aprender a respeitar os outros e as suas diferenças, a ter respeito pelos professores e pela escola, quando muitas vezes são os pais a mostrar que tudo o que não for igual ou muito parecido a eles próprios é mau?

Para surpresa de muitos, às vezes estes filhos crescem asfixiados em redomas segundo as apertadas normas e controlo que lhes são impostas até ao dia em que não aguentam mais e eles próprios se tornam naquilo que os pais mais temiam. Para que isto não aconteça é preciso acompanhar e estar atento, sem dúvida, mas confiar que quem criámos e educámos usará da melhor forma os valores que lhes transmitimos. Devemos estar sempre um passo atrás, guiar e aconselhar, mas deixando que possam também eles errar e acertar, e seguir um caminho seu.

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