Cinema Tivoli, Memórias da Avenida, um livro de Duarte de Lima Mayer e de João Monteiro Rodrigues, começou por ser imaginado com a descoberta de um caixote com fotografias antigas nos arrumos da família Lima Mayer, proprietária do Tivoli até 1973. A constatação que a descoberta era um acervo infindável de imagens, retratando grande parte da vida cultural lisboeta do século XX, deu lugar à preocupação de reunir os documentos numa única obra. O objetivo era registar memórias do Cinema Tivoli, uma sala de espetáculos desenhada pela Arquiteto Raul Lino e inaugurada em 1924, na, à época, ‘nova’ Avenida da Liberdade.
Hoje, ao mergulharmos neste livro deparamo-nos, por um lado, com o que Lisboa foi e, por outro, com o que pode vir a ser. O trabalho de arquivo apresentado revela-se exaustivo, reunindo fotografias, notícias da época, programas, cartazes, e textos de especialistas de cada uma das artes deste Templo de Cultura, como lhe chamou Raul Lino.
Documentos de arquitetura, cidade, cinema, música, dança e teatro transportam-nos de volta para a estreia do Cinemascope, para os filmes da Disney pelo natal, para as repetições da Música no Coração, ou para os passos, vozes e instrumentos que habitaram os sons daquela sala.
No entanto, além de nos deixar embebidos numa confortável nostalgia, a história do Cinema Tivoli e da Avenida é, acima de tudo, um testemunho de como no passado se conseguiu imaginar o futuro.
No rescaldo de guerras, invasões, transformações e crises, reuniram-se, no virar de século, em Lisboa, um conjunto de personalidades que escolheram reinventar cidade.
O polémico sonho de rasgar o primeiro jardim público da capital, o pombalino Passeio Público, para abrir uma Avenida da Liberdade era já de 1852, acompanhando a vontade política de celebrar a vitória dos liberais. Juntaram-se a este espírito da época as capacidades executivas e técnicas do Presidente da Câmara, Rosa Araújo, e do Engenheiro de Pontes e Passeios, Ressano Garcia, e Lisboa cresceu para uma área seis vezes maior que a sua dimensão setecentista.
A Avenida rasgou o terreno da família Lima Mayer em dois. À vontade de Rosa Araújo e de Ressano Garcia de construir numa Avenida ainda vazia, juntou-se o desejo do proprietário, Frederico Lima Mayer, de proporcionar cultura a Lisboa.
O filho Augusto manteve a tradição. Assim, a família Mayer, descendente de um francês que veio com Junot e por cá permaneceu enamorado pela cidade acaba por promover décadas de memórias e de espetáculos marcando os lisboetas e reinventando o panorama físico e cultural da cidade.
Hoje, na arquitetura da cidade de Lisboa, o Cinema Tivoli e a Avenida são testemunhos monumentais de como a cidade é sempre feita de um encontro de circunstâncias e de personalidades, onde o passado deve ser celebrado, mas onde o futuro se pode reinventar.