Se me perguntassem qual o principal desejo que eu gostaria de ver realizado na área da saúde, responderia de imediato: que houvesse um investimento a sério nos cuidados paliativos e uma aposta forte na área da prevenção.
Esta última tarefa recai sobre os cuidados primários, mais propriamente sobre os centros de saúde, que são hoje cada vez menos unidades de saúde e cada vez mais unidades de gestão. Importa, pois, recolocá-los nas funções para as quais foram criados, de modo a prestarem à população o serviço a que ela tem direito.
Fora da área profissional, o mais comum é dizer: que seja um ano feliz! A palavra felicidade está sempre presente na nossa mente, e é por nós utilizada vezes sem conta. Mas, paradoxalmente, são poucas as pessoas que se sentem mesmo felizes e ainda menos as que o revelam em público. O meu pai (já aqui o referi) era uma dessas exceções à regra – e muitos daqueles que o conheceram o recordam ainda hoje como ‘o homem feliz’.
Na maior parte dos casos, as pessoas passam a vida à procura do que não têm e não dão valor àquilo que têm. Preocupam-se com questões do dia-a-dia sem importância de maior, às quais se agarram, ignorando as coisas positivas – que acabam por passar para segundo plano, como dado adquirido. E, por isso, sentem-se permanentemente insatisfeitas. Não são totalmente felizes.
Nas consultas, por exemplo, a maior parte dos doentes queixa-se de problemas inevitáveis, próprios da idade, e não é capaz de olhar mais além, para tanta gente a viver na dependência de máquinas, de cadeiras de rodas ou de sondas, em muito piores condições, sem se queixarem.
A história que hoje partilho é uma caricatura do comportamento humano que reflete esta tendência, onde coisas insignificantes são capazes de interferir na nossa vida diária modificando os nossos planos.
O senhor Abílio (nome verdadeiro), de 73 anos, é por mim acompanhado no centro, já não posso precisar há quanto tempo.
Pela vida profissional ou em lazer, desloca-se com frequência ao estrangeiro, o que lhe permite ter uma visão do mundo diferente das outras pessoas que não tiveram idêntica oportunidade. O episódio que ele próprio me contou passa-se no decorrer de uma dessas viagens, neste caso aos Estados Unidos.
Na estação de metropolitano de Brooklyn (nos arredores de Nova Iorque), possivelmente devido a uma avaria momentânea, o seu passe não foi lido pelo sistema eletrónico e o torniquete não lhe permitiu entrar. Desanimado, tentou comprar um bilhete numa máquina ali perto, usando uma nota de cinco dólares, mas também não teve sorte – pois a máquina não aceitava notas, por falta de troco.
Revoltado com a situação, e sem saber o que fazer (quem saberia?), dizendo mal de tudo e de todos, preparava-se para se ir embora – quando lhe aparece à frente uma funcionária das limpezas que, ao vê-lo naquele estado, lhe pergunta: «Que tens tu?». O senhor Abílio, irritado, conta-lhe a história – e a mulher, depois de o ouvir em silêncio, volta-lhe as costas.
O senhor Abílio fica perplexo com a reação da fulana. Cada vez mais lhe parece estar envolvido numa história surreal. Até que vê a mulher caminhar na sua direção, trazendo um bilhete na mão. Depois de o receber, o homem propõe-se pagar-lho, mas ela recusa. Encarando-o nos olhos, e fazendo um sorriso aberto, diz-lhe apenas: «Sê Feliz!». E desapareceu no meio da multidão.
A viagem continuou, mas a mensagem não foi esquecida. ‘Sê feliz’ é o mesmo que dizer: ‘Ama a Vida!’ Não percas tempo com pormenores sem importância! Levanta a cabeça e vive bem contigo próprio!
De facto, na vida de todos nós devemos dar valor àquilo que realmente deve merecer a nossa atenção – e não perdermos tempo com insignificâncias. Preocupemo-nos com o que é mesmo importante. As coisas sem importância revelar-se-ão por si, na sua hora.
Procurando seguir a mensagem daquela mulher, agora que o novo ano começa, o melhor que posso desejar a cada leitor resume-se a duas palavras: «Sê Feliz!».