A história é exemplar, à maneira das novelas de Miguel de Cervantes: «chamei-lhes exemplares porque de todas se pode tirar um exemplo para a vida». Esta tem vinte anos e por cenário o claustro do Mosteiro dos Jerónimos.
O rendilhado de pedra estava em perigosa degradação e foi pedido apoio técnico e financeiro ao World Monuments Fund, para restituir a saúde à obra mandada erigir por D. Manuel I. Feito o estudo do existente, que demorou dois anos, o WMF apresentou uma proposta para a restauração do claustro, a executar num prazo de outros dois.
Como de costume, não havia dinheiro para suportar a parte do custo a cargo do país, e dez mecenas foram convidados a contribuir para o peditório. Reunidas as boas vontades, a obra arrancou, mas a lentidão era exasperante: raspadela aqui, vassourada acolá… e nada! O tempo passava e não se via obra feita, o que deixava nervosos os que gostam de ver as ‘coisas a andar’. E, na verdade, só andaram nos últimos seis meses; mas com uma tal precisão que tudo terminou uma semana antes do final do prazo e com uma poupança de cem mil dólares. Um milagre!
Qual foi o segredo do sucesso – no caso, a qualidade da execução, o cumprimento dos prazos e o respeito pelo orçamento? O estudo, que demorou dois anos, e a planificação dos trabalhos, que tomou mais um ano e meio, deixando à execução um único semestre dos oito que durou a intervenção.
Para todos os envolvidos, foi uma lição de gestão de projetos, abarcando o planeamento, a decisão, a execução e o controlo; para a Direção dos Monumentos Nacionais, um exemplo a seguir, na condição de ter força para resistir às pressões de quem sente a pulsão para exibir obra, ou de calendários eleitorais que obrigam a ‘pôr o carro à frente dos bois’, sabotando a disciplina dos trabalhos e o rigor financeiro.
A lição de bem-fazer não era inédita. Dois séculos antes, a reconstrução da baixa pombalina tinha, também ela, obedecido a um planeamento rigoroso, no caso militar, e os resultados estão à vista.
Infelizmente, esguichos aleatórios de vontade para exibir obra, na forma de delírios, fantasias, caprichos, amiguismos ou pura vaidade, levam a que, com demasiada frequência, se avance sem a bússola e sem o mapa que poderiam evitar os desvios – nos prazos e nos orçamentos –, que normalmente se traduzem em dinheiro para os bolsos dos que estão sempre a sonhar com concursos e adjudicações.
Nas décadas de obras da ANA, no aeroporto da Portela, está, porventura, um dos mais exuberantes exemplos de desregramento, só possível se tiver sido seguido um bom catálogo de anomalias, erros de projeto, paragens, trabalhos em horário noturno e trabalhos a mais.
Recentemente, o ministro Santos Silva falou dos défices de gestão da classe empresarial, mas apontou ao alvo errado. Melhor fora que tivesse falado dos défices que grassam na esfera governamental, de competências de gestão e outras, que são geradores de custos que vão direitinhos ao bolso dos contribuintes.