Na televisão é sempre difícil avaliar o comportamento do público nos estádios, mas julgo que a maioria dos espectadores na Rod Laver Arena apoiou mais Dominic Thiem do que Novak Djokovic na final do Open da Austrália.
Não é inédito na carreira do n.º 1 mundial, que sofreu reações verdadeiramente negativas das bancadas nas finais do US Open de 2015 e de Wimbledon em 2019.
Mas nessas finais defrontou Roger Federer, o ‘Deus vivo’ do ténis, que consegue a proeza de ter mais público do seu lado quando defronta Jo-Wilfried Tsonga no Court Philippe Chatrier em Roland Garros, Andy Murray no Centre Court de Wimbledon ou Lleyton Hewitt na Rod Laver Arena do Open da Austrália.
Nas 26 finais de torneios do Grand Slam que Djokovic disputou na sua ilustre carreira, cinco foram diante de Federer e oito frente a Rafael Nadal. As restantes foram face a Andy Murray (sete), Jo-Wilfried Tsonga, Stan Wawrinka, Kevin Anderson, Juan Martín del Potro e Dominic Thiem.
Não me recordo de ‘Djoko’ ser o preferido do público em alguma destas finais.
Nos confrontos com Federer e Nadal compreende-se porque são os campeões mais populares e consensuais da Era Open, a par de Bjorn Borg e Rod Laver.
Wawrinka, del Potro e Tsonga conseguem sempre, de uma forma natural, uma química com as bancadas.
Mas quando o fenómeno se repete com Murray, Anderson e Thiem o caso já muda de figura.
Djokovic é mesmo o mais mal-amado supercampeão da modalidade. Tirando raras exceções, não deteto uma animosidade contra ele como chegou a acontecer por exemplo com John McEnroe. É diferente, é mais quase uma recusa visceral da multidão anónima em dedicar-lhe o carinho e a idolatria que mereceria um desportista de exceção, que caminha a passos largos para deter um dia os recordes mundiais de títulos de singulares do Grand Slam e de semanas no topo do ranking mundial.
O artista de banda desenhada de culto Enki Bilal, nascido em Belgrado, deu esta semana uma entrevista na qual tem algumas declarações elucidativas.
«Federer e Nadal ultrapassam a pertença a uma nação. Pertencem a todo o mundo. O problema de Djokovic é que pertence a um país particular. (…) Houve essa guerra da ex-Jugoslávia na década de 1990 que conduziu o mundo ocidental a designar os bons e os maus (…) e o sérvio tornou-se no mau, do qual devemos desconfiar».
Análise que, não sendo original, é fascinante. Eu acrescentaria ainda que ao sérvio faltou ter sido capaz de transmitir uma imagem de autenticidade. Roger e Rafa são genuínos aos olhos do comum dos fãs. Djoko parece fabricado. É pena, pois merecia mais.