N.1965 Não estava planeado, foi o momento em que a paciência se esgotou. Corria a manhã de 4 de fevereiro de 2015 e José Carlos Saldanha tornou-se a voz dos doentes que então esperavam pela comparticipação da nova medicação para a hepatite C, que oferecia a hipótese de cura à maioria dos casos – e só estava a ser dada em alguns hospitais a doentes em maior risco. As negociações entre o Estado e a farmacêutica arrastavam-se há um ano para fechar um preço para assegurar o tratamento aos milhares dos doentes do país, mas o tempo de cada um ia fugindo. José, empresário de 50 anos, debilitado pela doença, soube naquele dia que tinha entrado na lista para transplante. Sentado com um grupo da plataforma hepatite C na comissão parlamentar de Saúde, onde os deputados colocavam ao ministro perguntas sobre o medicamento e Paulo Macedo não se comprometia, furou o protocolo. Levantou-se e interrompeu a sessão: «Senhor ministro, não me deixe morrer». As palavras fizeram eco no país e nas negociações, que desataram em 24 horas. No dia seguinte, o Governo anunciou que tinha chegado a acordo para tratar 12 mil doentes. «Por que gritei? Tem um canhão apontado e está ali a pessoa para o desviar, não pede socorro?», disse ao i. Mais de 5300 pessoas fizeram o tratamento naquele primeiro ano – até hoje são mais de 23 mil e cerca de 14 mil ficaram curados. Entre eles estava José Carlos Saldanha, que se tornou rosto da luta pela erradicação da doença, hoje mais perto. Morreu esta sexta-feira, aos 55 anos, vítima de uma septicemia.