O ténis é propenso a criar símbolos sexuais. Há cem anos, quando o desporto de alta competição feminino dava ainda os seus primeiros passos, já o ténis ia na vanguarda e Suzanne Lenglen fascinava, chocava e atraía multidões.
Ganhou o primeiro dos seus cinco títulos de Wimbledon em 1919 e escandalizou por jogar com saias abaixo do joelho, deixando visíveis os tornozelos e os gémeos.
Foi a primeira grande estrela do desporto feminino, dava-se com famílias reais e atores de cinema, e os media chamavam-na ‘La Divine’.
Com a legalização do profissionalismo em 1968, muito rapidamente percebeu-se que a imagem de símbolo sexual vendia bilhetes e patrocínios.
Chris Evert foi a namoradinha da América nos anos 70, Gabriela Sabatini fez suspirar nos anos 80 e foi a primeira a criar uma linha de perfumes, enquanto Andrea Temesvári inovou ao maquilhar-se sistematicamente, incluindo pestanas postiças.
Foi com Anna Kournikova nos anos 90 que o ténis descobriu a sua Marilyn Monroe. Foi a primeira tenista desde Suzanne Lenglen a ultrapassar as fronteiras do ténis. Chrissie, Gaby e Andrea eram as meninas bonitas do ténis, mas Anna rivalizava com modelos e atrizes.
Esse mediatismo ajudou o ténis feminino a crescer mas teve um lado perverso. Enquanto Lenglen, Evert e Sabatini eram também grandes campeãs, Kournikova deixou-se enredar pelo ‘star system’ e nunca ganhou um único torneio no WTA Tour.
Criou-se o estigma de que a beleza não andava de mãos dadas com o sucesso desportivo e foi nesse contexto que Maria Sharapova revolucionou o ténis e quebrou preconceitos.
A russa é a desportista mais rica da história, com rendimentos de 300 milhões de euros, dos quais ‘apenas’ 35 milhões em prémios monetários oficiais.
Masha conciliou na perfeição o ‘glamour’ fora do court com uma ferocidade e eficácia extrema dentro do campo.
Foi a segunda maior figura do ténis na sua geração com cinco Majors, um Grand Slam de carreira (ganhou Wimbledon, US Open e Open da Austrália, e Roland Garros duas vezes), uma medalha de prata olímpica, uma final da Fed Cup, um Masters e foi n.º 1 mundial durante 21 semanas.
O ténis teve muitas campeãs, alguns símbolos sexuais, mas divas apenas três. Lenglen faleceu em 1938, Sharapova pendurou de vez as raquetas esta semana minada por lesões no ombro e no antebraço. Resta Serena Williams.
Do doping não vou falar mais, já escrevi muito sobre o tema. Para mim, não define a sua carreira.
Prefiro recordá-la a jogar o US Open com o vestido negro de cristais, inspirado no filme Breakfast at Tiffany’s, qual Audrey Hepburn de raqueta em punho.