O presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), Manuel Machado, defende que as câmaras municipais obrigadas a cancelar ou a adiar espetáculos dos quais eram promotoras "devem, sempre que possível, tentar que esses espetáculos se realizem mais à frente, podendo adiantar parte do pagamento contratado a título de sinal", disse hoje Manuel Machado, reconhendo que esta é uma forma de ajudar os artistas a atravessar vários meses sem os rendimentos provenientes dos espetáculos ao vivo.
Para o presidente da ANMP, "é muito importante que a sociedade, no seu conjunto, comece já a preparar a vida coletiva que se seguirá ao declínio da pandemia: o apoio aos artistas e às atividades culturais para que possam atravessar esta fase sem rendimentos deve ser, nos diversos níveis do Estado, uma prioridade política".
Estas declarações foram feitas na sequência de uma conversa de Manuel Machado com Pedro Wallenstein, presidente da Gestão dos Direitos dos Artistas (GDA), a entidade que em Portugal gere os direitos de propriedade intelectual de músicos, atores e bailarinos.
A GDA apela às autarquias que cumpram pelo menos parte dos compromissos antes assumidos com artistas e que tenham sido cancelados devido à covid-19, seguindo o exemplo da Câmara de Lisboa, que anunciou que irá assumir 100% dos cachets dos espetáculos da sua responsabilidade que tenham sido anulados.
A Câmara de Coimbra, a que Manuel Machado preside, publicou em 31 de março um despacho, no qual o município anuncia que irá "assegurar o pagamento aos agentes culturais dos contratos já celebrados, nomeadamente os relativos à programação municipal no Convento São Francisco, mediante recalendarização das programações". O mesmo despacho visa "reduzir o número de cancelamentos" e reagendar "o máximo possível de espetáculos".
O pedido para conversar feito pela GDA ao presidente da ANMP teve como objetivo, segundo Pedro Wallenstein, sensibilizar as autarquias para "o momento de emergência económica que os artistas e outros agentes culturais hoje atravessam devido ao cancelamento de espetáculos promovidos por câmaras municipais", uma das principais fontes de rendimentos dos artistas portugueses — e, para muitos, a única.
"Para além de sensibilizar Manuel Machado para esta catástrofe que se abateu sobre os artistas, a conversa serviu também para a GDA se disponibilizar para, em casos mais complexos, mediar negociações entre municípios, enquanto promotores de espetáculos, e os artistas, enquanto prestadores de serviços", afirma Pedro Wallenstein.
"Durante a conversa, tivemos o grato prazer de verificar que o senhor presidente da ANMP compreende o problema e que, no seu próprio município, já o está a resolver da melhor maneira", acrescenta Wallenstein.
A GDA defende que as autarquias — assim como os promotores privados que tenham beneficiado de apoios públicos — devem recalendarizar o máximo possível de espetáculos, pagando desde já uma percentagem aos artistas e a outras profissões dos espetáculos, como adiantamento.
Quanto aos espetáculos que já não possam, de todo, realizar-se, a GDA sustenta que o prejuízo deve ser repartido com equidade entre os promotores e os prestadores de serviços, ou seja, os artistas e as outras profissões dos espetáculos.
Mais de 24.800 espetáculos foram cancelados, adiados ou suspensos em Portugal por causa das medidas de contenção da epidemia da covid-19, revelou na sexta-feira a Associação de Promotores e Espetáculos, Festivais e Eventos (APEFE).
"Estes números só poderão aumentar exponencialmente nas próximas semanas", face à renovação do estado de emergência por mais duas semanas, anunciada na quinta-feira pelo Presidente da República, alertou a associação em comunicado.
De acordo com um inquérito feito pelo Sindicato dos Trabalhadores de Espetáculos, do Audiovisual e dos Músicos (Cena-STE), 98% dos trabalhadores da cultura questionados viram trabalhos cancelados e 33% por mais de 30 dias, revelou também na sexta-feira a organização.
Em termos financeiros, para as 1300 pessoas que responderam ao questionário, as perdas por trabalhos cancelados representam ainda dois milhões de euros, apenas para o período de março a maio deste ano, de acordo com o Cena-STE (o que indica a perda de um valor médio de receita, por trabalhador, de cerca de 1.500 euros).