sta Páscoa, há produtores que ainda estão a recusar encomendas, quem fale em otimizações e há quem tenha tido uma quebra de 90% na produção de produtos relacionados com esta época festiva. Este é o caso da Pão de Gimonde, uma padaria em Bragança. «Isto foi uma brincadeira comparado com o que trabalhávamos», conta ao SOL a proprietária da padaria, que em 2019 vendeu três mil folares. Este ano, o estabelecimento vai produzir cerca de 300 folares, dos quais 250 estão já encomendados pelo Continente e a Mercadona, e a nível regional, pelo Pingo Doce – número que, no ano passado, correspondia às encomendas de cada um destes estabelecimentos.
Elisabete Ferreira explica que nesta altura costuma reforçar o número de trabalhadores. «O ano passado cheguei a ter 20», conta, explicando que, no resto do ano, dá trabalho a cerca de 12 pessoas. Este ano não foi diferente e a empresária contratou «três ou quatro pessoas». «Neste momento não preciso reforçar, preciso de reduzir», afirma, explicando que já há trabalhadores que estão em casa de férias. Apesar de «não vender pão quente», ou seja, não ter venda direta ao público, o estabelecimento continua a funcionar pois, para além de ser o único fornecedor de pão do Hospital de Bragança, há encomendas para centros sociais e instituições, onde «o consumo acaba por ser mais estável agora». Apesar de ser um bem essencial, Elisabete Ferreira garante que houve uma redução nas encomendas, porém, «não tão acentuada». As encomendas de pão, que rondavam as 1500 unidades, sofreram um corte de 50% e a padaria começou a distribuir, semanalmente, cerca de 650 pães. Já nas grandes superfícies, a queda foi menor, mas houve também uma redução de encomendas na ordem dos 30%, segundo a empresária, que sublinha não ter «nada a apontar» às grandes superfícies com que trabalha. Para para além da instituições e hospital, que agora são as únicas encomendas garantidas, a Padaria de Gimonde também produz para quintas e hotéis. «Aí é que eu noto o grande problema», acrescenta.
Trabalhadores e empresários esgotam todas as hipóteses
O encerramento em grande escala da restauração e unidades hoteleiras levou a que a Padaria de Giamonde começasse a receber encomendas para, pelo menos, «conseguir pagar salários». E na Queijaria Guilherme, em Serpa, o mercado da restauração «também está «parado». Ao SOL, o administrador explica que, «neste momento», o que existe é uma otimização da produção. «Embora possa haver um ajuste», o escoamento do leite de todos os produtores ficou assegurado. José Guilherme explica que houve ainda um ajuste na logística das entregas, que já aconteciam, mas que agora foram «reforçadas» , de forma a «tentar levar o produto ao consumidor o mais rápido possível e vendê-lo com as limitações atuais».
O número de encomendas feitas pelo Continente, Jumbo, Intermarché e o Corte Inglés também se alterou. «Há uns que pedem o que pediam e outros que pedem um bocadinho menos. Faz parte do próprio ajuste de logística e entrega nas lojas», explica ao SOL.
Apesar da otimização, que trouxe uma queda de, «no máximo, de 20%» todas as pessoas continuam a trabalhar. Enquanto, por norma, os turnos costumavam realizar-se entre as 7h e as e as 18h, há cerca de quatro semanas que os funcionários trabalham em dois turnos, e, na troca, José Guilherme garante que a empresa é desinfetada. O administrador explica ainda que o trabalho é possível apenas devido à «excelente equipa» da empresa. «As pessoas aderiram muito bem a este desfasamento de horários. Toda a gente está a fazer o sacrifício para que as coisas funcionem», conta.
‘Onda de solidariedade’
Também o presidente da Associação Nacional de Caprinicultores da Raça Serrana (ANCRAS) explica a importância das pessoas neste combate à pandemia. O empresário começou a ficar assustado quando, há duas semanas, tinha que «tirar os cabritos das explorações e as encomendas não apareciam». Uma mensagem que dava conta dos cerca de 800 cabritos que a associação tinha prontos para vender começou a circular na rede social WhatsApp e, a dia 2 de abril, a associação tinha, segundo Arménio Vaz, «cerca de 6 mil e-mails para encomendar cabrito». «Foi uma onda de solidariedade enormíssima e ainda estamos a responder a todas as pessoas», diz, explicando ao SOL que o problema agora está relacionado com os queijos. À semelhança do que acontece com a Queijaria Guilherme e a Pão de Gimondeno, também a ANCRAS não encontra o mercado da restauração aberto. «Vendíamos muito nos distritos de Bragança e Vila Real. As vendas caíram muito porque as pessoas têm o hábito de pôr ao almoço e ao jantar um bocadinho de queijo nas entradas. E, às vezes, até nas sobremesas. Como está tudo fechado, as vendas caíram muito», afirma, explicando que, por norma, se vendem nesta altura 900 queijos. Na semana passada venderam-se 12. A cooperativa vai, no entanto, continuar a recolher o leite e a queijaria a produzir o queijo, porém, o presidente explica que o problema vai ser quando não houver espaço para guardar o produto. «Quando o queijo vai para o mercado tem à volta de 60 dias de cura e esse queijo pesa 700 a 750 gramas. Se passa para os 90, 100 ou 120 dias de cura, vai diminuindo o peso», devido às lavagens semanais. O produto vai «enxugando cada vez mais e vai ficando com menos peso». «Esse prejuízo do peso é enorme para nós e tudo isso é contabilizado», explica.
Também a autarquia de Montalegre promoveu a compra dos produtos regionais. Ao SOL, o vereador David Teixeira explicou que desde que foi lançada, a 6 de abril, a iniciativa «foi muito bem aceite», tendo a autarquia recebido cerca de 100 pedidos de cabritos e cordeiros. O vereador sublinha que, nesta altura, «a primeira forma de ser solidário é ficar em casa», porém, não é a única, já que receber produtos regionais em casa é uma forma de ajudar os produtores nacionais. «Claro que não queremos entrar naquele discurso xenófobo de não valer a pena importar porque temos cá, mas queremos que as pessoas sejam sensíveis a esta dimensão nacional e aos portugueses que têm muitos produtos de qualidade».