Os novos diagnósticos de cancro nos hospitais CUF caíram 85% nas últimas semanas face ao que era habitual antes da pandemia – uma média de 80 novos casos detetados todas as semanas. O balanço do último mês está a fazer soar os alarmes, numa altura em que hospitais e centros de saúde deverão retomar a atividade programada, mas há milhares de consultas por recuperar.
Ana Raimundo, presidente da Sociedade Portuguesa de Oncologia e médica da CUF Infante Santo, explicou ao SOL que os dados da rede CUF, o maior diagnosticador privado a nível nacional e onde são feitos muitos exames prescritos no SNS, pode ser visto como um ‘barómetro’ do que se pode estar a passar no resto do país. «A incidência de cancro não diminuiu, pelo que podemos ter diagnósticos mais tardios, tratamentos mais tardios e eventualmente isso refletir-se em menores taxas de sobrevivência», alerta, defendendo a necessidade de continuar a sensibilizar a população para procurar consultas em caso de sintomas e fazer exames que tenham sido pedidos por médicos de família. «A situação nos hospitais e centros de saúde deverá ficar mais normalizada, mas é algo que nos preocupa e a perceção que existe é que houve uma quebra significativa nas consultas e meios de diagnóstico».
Ida Negreiros, coordenadora da Unidade da Mama da CUF Oncologia, admite que o receio de contrair a doença nos hospitais, o distanciamento social e toda a reformulação dos hospitais para lidar com a covid-19 pode ter contribuído para um maior afastamento. A médica diz ao SOL que na maioria dos doentes oncológicos que já estavam a ser seguidos, o acompanhamento manteve-se. São os novos casos que preocupam: «Uma redução de 85% nos diagnósticos significa que há muitas pessoas com doença que nos vão chegar em estádios mais avançados e que podiam e deviam ter sido tratadas antes. Estádios mais avançados significam menor expectativa de cura, o que é dramático», diz a médica.
Ida Negreiros alerta que há pessoas fizeram exames de rotina que têm alterações a esclarecer, e que por causa da covid-19 ou não os foram buscar ou não procuram o médico. «Outras terão um nódulo novo ou diferente dos que conhecem e não procuram o seu médico, pensando fazê-lo quando acharem que é mais seguro», diz. «A covid- 19 não vai passar tão cedo, vai introduzir alterações nas nossas vidas quotidianas às quais vamos ter de nos habituar. É preciso não descurar a vida e as doenças além da covid-19», apela, defendendo que a população deve ser alertada para as consequências do atraso no diagnóstico oncológico e não adiar a ida ao médico.
O Ministério da Saúde já anunciou que está a ser preparado um plano de recuperação da atividade suspensa por causa da Covid e que começarão por ser chamados doentes prioritários. Em março, os hospitais fizeram menos 9 mil cirurgias. Nos centros de saúde foram feitas menos 380 mil consultas, mas houve um reforço de 26% nas consultas não presenciais. Os hospitais registaram uma quebra de 180 mil consultas de especialidade.