Viveu da sua arte entre o hindi e o inglês e fazia amiúde a travessia entre Bollywood e Hollywood. Fê-la tantas vezes e com tanto sucesso que se tornou um dos nomes mais reconhecidos da indústria cinematográfica indiana, para depois ser chamado a blockbusters norte-americanos e ir construindo assim uma sólida reputação nos dois polos. O ator Irrfan Khan morreu ontem, aos 53 anos, na sequência de uma infeção no cólon, numa unidade hospitalar de Bombaim. A notícia foi confirmada pelo seu agente. “Irrfan era um ser forte, alguém que combateu até ao fim e que inspirava todos os que lhe eram próximos”, notou. O ator sofria também de um cancro, que lhe tinha sido diagnosticado em 2018.
Nascido em 1967, em Jaipur (estado do Rajastão), com o nome de Saahabzaade Irfan Ali Khan, Khan quis, primeiro, ser jogador de críquete mas, não conseguindo concretizar esse impulso, inscreveu-se numa escola de teatro. Tornou-se ator profissional na década de 80. Depois de participações televisivas conseguiu o seu primeiro papel no grande ecrã em Salaam Bombay!, em 1988, um filme de Mira Naar que foi nomeado para Óscar de Melhor Filme Estrangeiro. Em 2001, o cineasta britânico Asif Kapadia chamou-o para a sua adaptação do conto tradicional japonês O Guerreiro e a interpretação de Irrfan Khan, que somava uma série de títulos no currículo, destacou-se. No filme, Khan interpreta o papel de Lafcadia, um guerreiro indiano que tem uma crise de consciência e acaba por escolher um caminho sem violência. O filme, rodado com um baixo orçamento, venceu nesse ano o Bafta de melhor filme britânico. Estava assim cruzado o caminho entre cinemas que haveria de percorrer de forma consistente nos anos seguintes.
Dois anos depois protagonizou Maqbool, um policial indiano de Vishal Bhardwaj adaptado a partir de Macbeth, de Shakespeare. A seguir vieram as histórias que o tornaram um ator conhecido em todo o globo. Em 2007, ao lado de Angelina Jolie, entrou em Um Coração Poderoso, de Michael Winterbottom. O filme foi apresentado em Cannes e, no ano seguinte, Irrfan Khan juntou-se ao estrondoso sucesso de Danny Boyle Quem quer ser bilionário?. Na película, protagonizada por Dev Patel e Freida Pinto, Khan deu vida ao polícia que inferniza a vida das crianças. A Vida de Pi (2012), A Lancheira (2013) e as megaproduções O Fantástico Homem-Aranha (2012), Mundo Jurássico e Inferno (2016), ou a versão indiana de O Livro da Selva (2016) constam também, entre outros títulos, do seu currículo.
Em 2018, quando lhe foi diagnosticado cancro, o ator escreveu um comunicado que partilhou nas redes sociais em que, citando Margaret Mitchell, lembrava o lado unilateral do destino. “A vida não tem nenhuma obrigação de nos dar o que esperamos”, escreveu. Arregaçou então as mangas para fazer a sua parte, regressando ao trabalho, e gravou a comédia dramática Angrezi Medium, de Homi Adajania. Um último suspiro, ou talvez sorriso, que lhe sobreviveu: a estreia do filme foi adiada devido ao surto.