Por Inês Moreira da Cruz
Aqui em casa continua a rotina desde que começou a quarentena. O meu marido é o único que vai trabalhar e eu ocupo-me das tarefas domésticas e do meu filho. Faço praticamente tudo com prazer, menos as refeições. Detesto cozinhar, como todos na família! A única exceção é o meu pai. Ainda me lembro dos animados almoços ao fim de semana em que comíamos feijoada, ervilhas guisadas, arroz de tomate com pataniscas, pastelão de bacalhau, bifes de cebolada… E que dizer das sobremesas! O meu pai preparava farófias, arroz doce, aletria e outros doces portugueses de colher. Os bolos e as trufas de chocolate ficavam a cargo da minha irmã Filipa. O meu marido também gosta de preparar petiscos, mas eu tenho mais sorte que a minha mãe porque a cozinha fica sempre imaculada!
O meu filho adaptou-se bem à escola em casa, embora haja dias em que tenha menos vontade. Assim que começa a acusar o cansaço intelectual fechamos livros e cadernos e pomo-nos a ginasticar. O meu sobrinho partilhou connosco o ‘abecedário da ginástica’. É simples e divertido: cada letra tem uma série de exercícios físicos correspondente. Por exemplo: a – Saltar 10 vezes ao pé coxinho; b -Correr 20 segundos sem sair do sítio; c – Fazer 5 flexões e isto até chegar ao Z. Cada um escolhe uma palavra e devemos fazer os exercícios atribuídos a cada letra. Eu opto por pai, mãe, casa para não me cansar, enquanto a criança de 6 anos cheia de energia prefere futebol, Benfica, família e coronavírus.
O Diogo não tem irmãos e, para seu grande desgosto, os três primos vivem longe. O Natal e o Verão não chegam para matar saudades. Felizmente, as redes sociais permitem reduzir a distância e quando falam ao telefone ou fazem chamadas por vídeo parece que estiveram juntos no dia anterior! Acontece exatamente o mesmo quando comunico com os meus irmãos. No início do isolamento social criamos o grupo ‘Manos’ no WhatsApp onde partilhamos vídeos, histórias dos países onde vivemos, mensagens de força e reconforto. A Joana põe-nos a dançar ao som de música italiana e o Diogo faz-nos rir com o humor inglês. Várias vezes fazemos chamadas coletivas e eu oiço o meu cunhado francês perguntar: «Filipa, o que é que aconteceu, por que é que estás aos gritos?». Em contrapartida, o meu cunhado italiano não estranha tanta risada ou choro. É latino e está habituado a expressar as emoções como nós.
O facto de passar muito tempo com o meu filho permite-nos estabelecer uma grande cumplicidade. Ele é curioso e faz muitas perguntas. Quer saber que tipo de criança era eu, quais as brincadeiras que fazia com os meus irmãos, como eram os avós como pais. Um dos seus sonhos é andar de avião para visitar a família. Não tem sorte porque eu e o meu marido detestamos este meio de transporte. Eu tenho uma verdadeira fobia!
Ainda me lembro da viagem aos Estados Unidos. Tinha 16 anos e fui com a Filipa visitar a Joana. O voo Lisboa – Londres foi rápido. Passamos a noite na capital britânica num hotel mesmo ao lado do aeroporto. A minha irmã desfrutou do sono dos justos, mas eu não preguei olho a noite inteira, apavorada com o voo do dia seguinte. Londres-Atlanta: a viagem mais longa da minha vida! Tempestade, turbulência, bandejas a cair, pessoas a vomitar, hospedeiras coladas aos assentos… As minhas mãos ora estavam suadas ora estavam geladas e eu não parava de beber água e comer amendoins. Ainda hoje não entendo como a minha irmã foi capaz de ver filmes, escolher o menu e falar em inglês com a vizinha do lado. Tudo isto durante uma viagem apocalíptica!
Apesar desta experiência digna de um filme de terror prometi ao meu filho fazer um esforço para ultrapassar a minha aversão aos aviões. Iremos a França para estar com os primos, passaremos férias na doce Itália e visitaremos a família que está em Londres. Amor de mãe não tem limites e a pandemia ajudou um bocadinho. Temos que aproveitar todos os momentos da vida junto dos que mais contam.