Hoje uma amiga desabafava num grupo que temos no WhatsApp: ‘Tenho saudades minhas!’ Como a compreendemos!
Se na vida pré-confinamento achávamos que tudo passava a correr e que não havia tempo para nada, para quem tem filhos, este tempo não é muito diferente. É certo que nem todos temos de acordar com o despertador, que é um tempo mais calmo e descontraído, com maior disponibilidade, que não nos metemos no carro durante horas em filas de trânsito depois de nos despacharmos e a todos em jeito de relâmpago, nem saímos a altas horas do trabalho. Mas o trabalho está sempre connosco.
Os filhos pequenos são muito exigentes e dedicamos-lhes grande parte do dia. Seja a brincar, a cuidar, a ouvi-los, a ensinar, a preparar-lhes refeições, a tentar fazê-los felizes… Depois vem a casa, com todas as tarefas inerentes. A seguir o trabalho para além do trabalho, para quem o tem. E no finalzinho do dia, quando lavamos os dentes, descobrimo-nos mesmo ali à frente, no espelho. Já nem nos lembrávamos que existíamos. Na verdade, muitas vezes é quando visto o pijama que me apercebo do que vesti de manhã.
Tudo aquilo que somos, com o tempo que temos para nós, nem que seja nas filas de trânsito ou no supermercado, desaparece. Os sítios onde íamos às vezes e que nos fazem falta já pertencem a outra vida. Os nossos amigos e familiares não passam de uma voz ou de palavras trocadas em mensagens. Ou quando muito de imagens desfasadas num pequeno ecrã. E nesta nova vida que não para, em que vivemos sobretudo para os outros, ficamos esquecidos entre tantas solicitações.
Também eu tenho saudades minhas. Tenho saudades do meu tempo, dos meus pensamentos, da família com quem não posso estar, da amiga que tem saudades dela própria, de todos os outros meus amigos, dos momentos que passávamos juntos, do mundo lá fora. De tudo de que também sou feita.
Mas confesso que pesando tudo dificilmente abriria mão deste tempo de comunhão com a família. Este privilégio de estar com o meu marido e os meus filhos a tempo inteiro. De ver os mais pequenos passarem os dias livremente em aprendizagens espontâneas e autênticas, em brincadeiras que criam, almoçarmos em família, aproximarmo-nos, mimarmo-nos, termos tempo para brincar e descobrirmos juntos tantas coisas que não sabíamos que existiam. Este é um tempo único, que não irá voltar. Apesar de tudo, eu acho que me irei reencontrar depois dele. E espero conseguir levar comigo um pouco do que somos e descobrimos juntos agora.