De «um país, dois sistemas», o famoso lema de Deng Xiaoping, para «um país, um sistema». Pequim visa impor unilateralmente uma lei de segurança nacional que tem o objetivo de tornar Hong Kong, uma região administrativa especial, cada vez mais parte integrante do continente. Leis de detenção arbitrárias, propaganda nas salas de aula e vigilância podem começar a fazer parte do dia a dia de um território que vê a sua relativa autonomia ameaçada.
O sinal foi dado na quinta-feira, mas ontem, no encontro anual da legislatura chinesa, no Congresso Nacional do Povo – o mais importante evento político na China – foram conhecidos mais detalhes sobre a lei.
No relatório do Executivo de Pequim sobre Hong Kong, na abertura do Congresso, o primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, disse que o Governo central ia implementar com «precisão» o princípio «um país, dois sistemas» e salvaguardar o poder dos cidadãos de «Hong Kong governarem Hong Kong». Mas também sublinhou que era necessário reforçar os mecanismos para salvaguardar a segurança nacional na região administrativa especial.
Já Wang Chen, vice-presidente do Comité Nacional do Congresso do Povo (o 13.º), um órgão composto por quase três mil delegados, argumentou que Hong Kong se tornou num problema proeminente. E referiu as atividades na megacidade – leia-se, os protestos contra o que veem ser uma interferência de Pequim na região – como tendo seriamente desafiado o princípio «um país, dois sistemas». Além disso, disse Wang Cheng, os manifestantes danificaram o primado da lei; ameaçaram a soberania nacional; a segurança e os interesses desenvolvimentistas da China.
O documento prevê que o Partido Comunista da China possa destacar «órgãos relevantes de segurança nacional» para Hong Kong, dando cobertura legal pela primeira vez ao aparato de segurança de Pequim para operar no território semi-autónomo, desde que a megacidade foi entregue à soberania chinesa pelo Reino Unido, em 1997.
Esta nova lei, que se prevê que seja aprovada na próxima semana (o Congresso durará quatro dias), pode banir «a atividade secessionista e subversiva, tal como a interferência externa e o terrorismo» em Hong Kong, segundo fontes do South China Morning Post.
O desenvolvimento dos protestos em Hong Kong e a oposição a Pequim, agora silenciados pela pandemia do coronavírus, têm perturbado o Governo central. Principalmente quando as ações se tornaram mais violentas, no final do ano. Os olhos de todo mundo fitaram o que se passava no centro financeiro asiático, desde que os protestos explodiram há quase um ano – foram desencadeados pela lei de extradição, entretanto removida, e configuraram o maior episódio de oposição a Pequim vinda daquela parte da China.
«Se os agentes do aparelho de segurança nacional puderem operar em Hong Kong, se puderem usar os mesmos métodos que usam na China», disse Leung Kwok-hung, ativista político de Hong Kong, «é o nosso fim».