Quatro irmãos, quatro países. Inês Moreira da Cruz: “Recordar é viver”

Este maldito vírus trocou-nos as voltas. Desta vez improvisámos, adaptando-nos à situação única que estamos a viver. Fizemos um almoço especial em casa, o meu filho deu-me o seu presente no qual escreveu: «A minha mãe é muito corajosa» e vimos um filme em família. Afinal, o importante é estarmos juntos e de boa saúde.

2020 será sempre recordado como um ano horribilis. A pandemia veio mudar tudo. A Páscoa, o 25 de abril, o 1 e o 13 de maio foram celebrados de forma diferente. E o dia da mãe não foi exceção. Desde que o meu filho nasceu, esta data passou a ser tão importante como o meu aniversário. O meu marido pede o dia livre e aproveitamos para fazer um piquenique, ir almoçar ao restaurante, ou passear num sítio que não conhecemos. O primeiro domingo de maio é sempre celebrado com pompa e circunstância.

Este maldito vírus trocou-nos as voltas. Desta vez improvisámos, adaptando-nos à situação única que estamos a viver. Fizemos um almoço especial em casa, o meu filho deu-me o seu presente no qual escreveu: «A minha mãe é muito corajosa» e vimos um filme em família. Afinal, o importante é estarmos juntos e de boa saúde.

Quando éramos crianças eu e os meus irmãos organizávamos surpresas para oferecer à nossa mãe. Desenhos, poemas, pinturas, bolos confecionados por nós. À medida que fomos crescendo as prendas passaram a ser mais personalizadas e complexas. Tentamos ser originais e, ao mesmo tempo, oferecer algo que a nossa mãe goste.

Uma das melhores surpresas talvez tenha sido o fim de semana em Madrid. Decidimos presenteá-la com uma viagem. Ela adora Espanha e escolhemos aquela cidade como destino. Na altura, a Filipa trabalhava numa grande companhia hoteleira e tinha direito a estadias em hotéis de cinco estrelas a preços bastante atrativos para ela e os membros da família. Quando nos anunciou o valor do quarto num hotel de luxo no centro de Madrid não hesitamos! E ainda tínhamos direito a 50% de desconto no restaurante e no bar. Como dos quatro irmãos, eu era a única disponível, acompanhei com muito prazer a minha mãe durante três dias na capital espanhola.

Nunca mais me esquecerei do luxuoso hotel situado em frente do parque do Retiro e a dois passos do museu Reina Sofia. Melhor localização, impossível! E até o clima estava do nosso lado: dias de sol com uma temperatura agradável. Um fim de semana inesquecível que começou de forma anedótica. O que poderia ter sido uma situação constrangedora transformou-se num motivo de risada. Talvez porque eu consigo sempre ver o lado bom das coisas.

Após o check-in, um rapaz ajudou-nos a levar a bagagem. Aproveitou para nos mostrar os espaços públicos do hotel, perguntou-nos se era a primeira vez na cidade e explicou-nos a história do hotel. Quando finalmente, ele abriu a porta do nosso quarto…surpresa! Estava um casal de roupão sentado em cima da cama. Parecia caído das nuvens! Ficou sem reação. O funcionário como profissional cinco estrelas tentou disfarçar o constrangimento. Pediu desculpa aos hóspedes já instalados, fechou a porta discretamente e apressou-se a chamar o elevador. Eu não me contive, desatei às gargalhadas e a minha mãe foi atrás. Dentro do elevador a cena tornou-se ainda mais hilariante. Nós a rir até às lágrimas e o rapaz sem perder a sua postura. Certamente com tanta vontade de rir e sem poder! De novo no hall, instalou-nos em duas confortáveis poltronas enquanto resolvia a situação. Pouco tempo depois, voltamos a subir, desta vez até ao último andar. Para nosso espanto, ficamos instaladas numa grande suite com uma vista deslumbrante de Madrid. E recebemos uma garrafa de vinho e um tabuleiro com queijos e enchidos. Há males que vêm por bem!

Esperemos que, a partir do próximo ano, voltemos a celebrar todas as festas do calendário como se devem. Eu já tenho uma ideia para o próximo dia da mãe. E desta vez, espero que os meus irmãos estejam presentes. Até lá, vou recordando memórias como estas que me ajudam a manter a sanidade mental e a impedir que o medo da covid-19 supere a minha alegria de viver.