Somos o segundo país com melhores autoestradas da Europa. Temos a melhor qualidade da água e o saneamento básico concluído. Estamos entre os nove países mais digitalizados do Mundo. Com as lojas do cidadão cobrimos o país de fibra ótica. Temos mais ‘cloud’ por serviço público que a Espanha. Cada família portuguesa tem pelo menos duas casas. Temos uma hotelaria de qualidade. Temos um serviço de saúde resiliente, que não colapsou com a pandemia e um bom rácio de médicos por habitante. Temos das melhores tropas especiais do mundo. Temos um desempenho acima da OCDE no Pisa. Temos boa performance na descarbonização. Temos mais arquitetos que a China. Exportamos mais de 46% do que produzimos. Temos a geração do Euro (na idade de chegar ao poder, mas a ganhar 600 euros) mais bem preparada de sempre e uma geração de Millennials (a chegar à idade adulta) igual à de todos os outros países do mundo globalizado.
E, contudo, somos o terceiro país mais pobre da UE, quando estávamos a meio da tabela; cada vez mais pobres, caímos 23 lugares no ranking das maiores economias e somos cada vez mais velhos (temos a idade média mais elevada nos trabalhadores das empresas cotadas e da administração pública). Somos pessimistas e temos a terceira maior dívida pública do mundo. Isto agravou-se com a pandemia. Vendemos as principais empresas a chineses e insistimos em entregar-lhes o porto de Sines e a Galp, mesmo sabendo que podem ser estratégicos para as exportações de gás dos EUA. Um ministro até lhes quis vender terra no Alentejo.
Em 45 anos de Integração, as coisas não nos correram bem!
O mais preocupante é que quando se fala em novos planos e de milhões, lá vem sempre a mesma trilogia da Europa, da pobreza e da corrupção associada: mais investimento em infraestruturas, mais direitos sociais e mais Estado.
Mas a questão essencial é que não sabemos fazer planos. O planeamento começa pela definição da Missão e da Visão. Sem isso, temos um elencar de medidas, mais ou menos copiadas de outros países da OCDE, mais ou menos propostas pelos serviços, mais ou menos populares. O plano em Portugal tem sido apenas tático (como as ideias de Costa e Silva) e na maioria dos casos (como nas propostas do PSD) é apenas operacional.
Vamos ser claros. Não precisamos de mais infraestruturas: nem de mais autoestradas, nem de mais fibra ótica; não precisamos de mais comboios (que apenas nos secundarizam relativamente a Espanha), nem de mais mobilidade nas cidades, nem de menos emissões de carbono. Nada disso nos torna mais ricos. Trabalhar para rankings das infraestruturas, do digital, da leitura, do carbono, como se fez com os programas socialistas do passado, não melhora a vida dos portugueses.
O que falta é ‘sentido’ a Portugal. E depois, uma visão nacional, mobilizadora e ambiciosa. Não precisamos sequer da aprovação da Europa. Os descobrimentos foram uma política sigilosa, refere Magalhães Godinho, contra Castela e Veneza.
Quando perguntamos aos nossos estrangeirados (adoramos doutorados de Harvard e do MIT), o melhor que conseguimos é transformar Portugal num asilo de reformados ricos, pelo que seremos todos empregados de mesa ou de supermercado, cuidadores, cabeleireiros e coveiros. No melhor dos casos, animadores turísticos. Saloios, nem sabem que é melhor envelhecer no sul de França ou em Itália. E, contudo, foi isso que fomos, ao ponto de o turismo representar mais de 8 % do nosso PIB e mais de 14 % do emprego.
Ficámos mais ricos? – Claro que não!
O que aprendemos com o covid-19 foi que o turismo é pouco rentável, exige muito capital e não é resiliente nas crises. Não precisamos de mais turismo, portanto. A aposta que foi feita foi excessiva. Foi preguiçosa: aceitou, como inevitável, a nossa aparente vantagem competitiva do turismo. Não podíamos ter comprometido tantos recursos num setor tão pouco resiliente, sobretudo agora que sabemos que as crises sanitárias, climáticas ou outras serão o novo normal.
Gosto da ideia de terem escolhido um poeta para fazer o plano, embora estranhe que venha da Partex. Espero que saiba de História e que entenda que Portugal só se fez grande quando, contra a Rota da Seda, soube planear a Rota da Índia.
Mas espero que Costa e Silva saiba que, para essa aventura, foi necessária tecnologia que não tínhamos e sobretudo, a madeira do Pinhal de Leiria, plantado 20 anos antes, por D. Diniz (o ter ardido agora, até parece a maldição da Índia, que nos convoca a regressar lá de novo). E que saiba também que, primeiro, temos que ir a Marrocos, depois à Guiné, à Costa do Marfim, ao Congo, ao Cabo, à Zambézia e à Etiópia e que, só depois, chegaremos a Malabar e ao Japão.
Tudo começa pela Missão e pela Visão – são definições políticas. Só depois, os cenários, os objetivos e a ação…E sobretudo, que levará muito tempo e será difícil, este desconfinamento cosmológico na “viagem” de Portugal, que inspiradamente D. Tolentino de Mendonça evocou no 10 de Junho.