É surpreendentemente baixo, mesmo para a região África Central Austral, o número de contaminados e mortos, em Angola, pelo Corona Vírus, respectivamente (a 22 de Junho) 186 e 10. Há factores gerais que podem explicar a relativa baixa incidência da pandemia em África, sobretudo na África Central e Tropical: as elevadas temperaturas; a juventude da população – Angola tem uma média etária de 15 anos e cerca de 3% de cidadãos e cidadãs com mais de 60 anos; e, acima de tudo, o tratar-se de uma população muito atingida por outras epidemias – SIDA, Malária, Cólera, Tifo. Estas epidemias, tradicionais e recidivas, foram criando imunidade nos locais e seus descendentes.
Nesse sentido, o que mais preocupa o Governo angolano, que aliás tomou medidas às primeiras notícias da pandemia, (embora com a noção da dificuldade de implementação do confinamento e do distanciamento social nas zonas suburbanas de Luanda, onde vivem milhões de pessoas em condições difíceis e que têm que trabalhar todos os dias) tem sido de ordem económico-social.
Até porque o país continua a ser, apesar de alguns esforços de diversificação da economia, uma petroeconomia. E uma petroeconomia em tempo de petróleo barato é um problema muito sério. E Angola tem, também, uma dívida pública alta, embora inferior à de Portugal.
Mesmo com projectos e investimentos fora do sector petrolífero a tomarem forma, não há ilusões, entre os dirigentes políticos e os estrategas económicos de que, ainda por algum tempo, o país vai depender da produção petrolífera, logo de um factor aleatório dependente de preços internacionais. A produção duplicou entre 1987 e 2000 de 400 mil, para 800 mil barris/dia. E entre 2002, ano do fim da Guerra Civil e 2008, a produção aproximou-se dos dois milhões de barris/dia. A partir daí oscilou em sentido descendente e depois baixou. Em Abril deste ano foi de 1.350 mil barris e depois, com os acordos na OPEP de baixar a produção para levantar os preços, passou em Maio para pouco mais de 1.200 000 barris/dia.
Com o preço actual do Brent (42/43 dólares/barril) em 24 de Junho, a situação não é trágica, já que o custo médio do barril produzido anda pelos 20 dólares. Além disso, depois de uma quebra de produção que se prolongou por vários anos, devido à falta de investimento em novos campos nos últimos anos da presidência de José Eduardo dos Santos, os acordos com as grandes companhias internacionais, concluídos há dois anos, estão a trazer novos investimentos no sector.
O problema financeiro principal de Angola é o peso da Dívida Externa, que anda por perto dos 48 mil milhões de Dólares, mais ou menos 44,5 mil milhões de Euros. Desta dívida quase metade é à República Popular da China, (RPC). Serão 22 mil milhões de Dólares, chegando-se até a aventar que o país poderia ceder a Pequim “activos estratégicos” para amortizar o valor da dívida, à semelhança do que vêm fazendo outros países africanos, em termos de entrega de terras, como Moçambique, ou de gestão de portos. Neste último caso, uma rede que se estende pela costa ocidental da Serra Leoa e Costa do Marfim ao Congo (Brazaville) e se prolonga na Costa Oriental. Ao todo são 11 portos importantes que são geridos por empresas chinesas.
Na verdade, os encargos anuais da dívida – cerca de 5 mil milhões de Dólares – pesam decisivamente nas finanças do país. Mas os conhecedores da História e da realidade do país não acreditam nessa possibilidade, que iria ao contrário da tradição e da prática do nacionalismo angolano. Além disso, com o petróleo a recuperar nos mercados internacionais e as economias a reabrirem – espera-se em breve uma retoma forte no sector da aviação – a ideia é que a situação financeira irá também gradualmente melhorar.
Quanto à negociação da dívida com a China, Pequim não terá gostado da aproximação de Luanda com Washington, nos últimos tempos. O que não é estranho, mas está também na tradição realista angolana. O governo do MPLA no auge da Guerra Fria, e com Washington a apoiar a UNITA no terreno a partir de 1984, nunca interrompeu as operações petrolíferas das companhias norte-americanas.
A negociação com a China não parece fácil. Por um lado, existe a noção que os países “ricos” têm todo o interesse em evitar uma catástrofe económico-social em África e que a maioria dos países africanos, se não tiver um perdão parcial da dívida ou uma facilitação nos prazos de pagamento, entrará em situações próximas do caos.
No início do mês, Angola anunciou uma baixa nos envios de petróleo para a China, para pagamento da dívida. Dia 18 de Junho, Xi Jimping anunciou que a China iria perdoar parte das dívidas de África. Estas, neste momento, somam 143 biliões de dólares de 49 países, empréstimos concedidos entre 2000 e 2017.
Em Angola, estes financiamentos foram essencialmente para projectos de infra-estruturas, incluindo o novo Aeroporto de Luanda, a central hidroeléctrica de Caculo Cabaça e a reconstrução do Caminho de Ferro de Benguela.
A política de Pequim, neste momento, parece seguir a linha da expansão económica e da influência financeira, mas com a diferença de procurar agora obedecer também a uma estratégia de influência política. Algum mal-estar em relação à aproximação de Luanda a Washington e alguma resistência na facilitação da negociação das regras da Dívida pendente podem vir daí, de uma tentativa de pressão para contrariar esse movimento, numa época em que a tensão entre os dois candidatos à hegemonia mundial está a subir, num quadro que alguns já classificam como de nova Guerra Fria.
Mas também podem, como sucede muitas vezes neste tipo de situações de competição, adotar uma atitude positiva. Além disso, dado que a solução adoptada pela China em relação aos países do Continente Africano foi o perdão parcial ou o reescalonamento, não se compreenderia uma atitude discriminatória em relação a Angola.