Desconfinamento a subir à cabeça das pessoas

A tentativa de regressar ao ‘novo normal’ tem dado origem a estranhos relatos, desde eventos aprovados pelas autoridades a festas clandestinas.

Vários países do mundo começam a abrir as portas ao desconfinamento e a aligeirar as medidas de restrição. Contudo, a excitação do regresso das atividades ao ar livre levou à criação de eventos, alguns promovidos pelas autoridades, outros ilegais, que causaram uma certa indignação. 

Uma das propostas que suscitaram mais estupefação aconteceu na República Checa. De forma a assinalar o fim do confinamento, milhares de cidadãos reuniram-se esta terça-feira na Ponte Carlos, em Praga, à volta de uma mesa de 500 metros para jantarem em comunhão e com música ao vivo.

A única condição para participar no evento ‘A mesa está posta’? A partilha de comida e bebida, sem qualquer distanciamento ou uso de máscara. O evento levantou uma onda de indignação, até porque a situação pandémica na região ainda não está controlada e existem vários surtos locais no país, que tem registado 15 casos de infeção por dia, em média. No total, a República Checa registou cerca de 12 mil casos de infeção e 350 mortes.

Uma luz que nunca se apaga

Em Amesterdão, o red light district, bairro da luz vermelha, mais conhecido como uma zona de prostituição legalizada, retomou a atividade depois de ter sido encerrado em março devido à pandemia.

A decisão do Governo holandês de antecipar a data de reabertura da indústria do sexo de 1 de setembro para 1 de julho aconteceu depois de uma campanha feita pela Red Light United, um sindicato que representa as prostitutas, para que pudessem regressar ao trabalho o mais rápido possível, uma vez que as dançarinas eróticas e as prostitutas não tiveram acesso a apoio estatal durante o período de confinamento, gerando dificuldades financeiras que levaram estas mulheres a recorrer a trabalho ilegal.

A indústria compilou uma lista de recomendações que inclui posições sexuais a evitar. Contudo, mesmo com estas novas orientações, Debbie Mensink, uma conselheira de saúde pública em Amesterdão, relembra que as prostitutas estarão, em comparação a outros profissionais, mais expostas aos perigos da covid-19. "As trabalhadoras do sexo já correm um risco elevado de saúde devido ao seu ramo de trabalho, dada a proximidade dos clientes".
Foxxy, uma profissional do sexo, explicou os novos cuidados que tem que ter no seu trabalho. "Antes de marcar qualquer sessão tenho que confirmar se o cliente se sente bem e se ele ou as pessoas com quem partilha casa não apresentam nenhum sintoma".

Em relação ao encontro, existem diversos cuidados a ter como "a desinfeção e limpeza das mãos, a limpeza de lençóis depois de cada cliente", explica Foxxy. "Estas são as medidas básicas. Mas não precisamos de usar máscara durante os encontros, graças a Deus". E acrescenta que a maioria das trabalhadoras evita o contacto cara a cara com os clientes, "por isso, nada de beijos", avisa.

"Recomendamos que não se aproximem da cara, de forma a não inalarem a respiração quente um do outro. Também recomendamos que não se beijem, uma vez que a saliva transporta o vírus», aconselha Debbie Mensink.

Apesar de a pandemia ainda estar ativa na Holanda, o número de novas infeções e mortes pelo coronavírus caiu rapidamente nas últimas semanas, por isso o Governo começa a flexibilizar algumas restrições. No dia 1 de julho, as missas passaram a ser celebradas na presença de um número maior de fiéis do que os 100 originalmente permitidos.
Desde março, a Holanda regista mais de 50.000 infetados e mais de 6000 mortos.

 

Festa nas ruas de Espanha 

Relatos de 50 novos surtos no país e de um festival clandestino em Irun, município do País Basco na província de Guipúscoa, causaram a indignação da população, depois de vídeos amadores mostrarem centenas de pessoas reunidas nas ruas, no passado dia 30 de junho, a festejar sem respeitar as normas de segurança. Esta festa aconteceu no mesmo dia que se devia ter celebrado o festival anual de San Marcial, que já tinha sido cancelado pelas autoridades.

Imagens semelhantes ocorreram em Ciutadella de Menorca, um município das Ilhas Baleares, onde centenas de pessoas se juntaram sem respeitar as normas de distanciamento e ou a usar máscara.

Num período de sete dias, que terminou a 30 de junho, foram contabilizados 1978 casos de infeções ativas, o que representa uma subida de 8,8% em relação à semana anterior.

No País Basco foram confirmados 49 casos de infeção e 3 mortes relacionadas com o coronavírus na última semana.
Em Espanha, a pandemia causou mais 28 mil mortes num total de cerca de 250 mil casos de infeção.

 

Teremos sempre Paris 

O governo francês autorizou a realização da Festa da Música, a 21 de junho, na condição de serem respeitadas regras de segurança, no entanto, parece ter-se arrependidos com esta decisão depois de as celebrações se terem descontrolado.

O ministro da Cultura francês, Franck Riester, criticou as concentrações. "Permitimos que se realizasse esta festa, mas pedimos responsabilidade, individual e coletiva. Globalmente, foram respeitadas as regras de segurança, mas houve quem não o fizesse. Lamentamos e deploramos", disse.

Em alguns casos, foram registados incidentes entre o público e polícias que tentavam dispersar as concentrações, o que resultou em ferimentos de um agente e na detenção de sete pessoas.

Mas a história não fica por aqui, sete dias após o festival de música, em Paris, cinco pessoas foram detidas e nove polícias feridos durante um confronto na praça dos Invalides, onde jovens participaram numa festa convocada nas redes sociais sob o nome ProjectX, referência ao filme norte-americano com o mesmo título.

França é atualmente, depois do Reino Unido e de Itália, o terceiro país europeu mais afetado pela pandemia, com mais de 29 mil mortos e mais de 166 mil casos.