Emmanuel Macron, Presidente francês, na véspera do início do julgamento dos jovens que levaram a cabo o atentado ao jornal Charlie Hebdo disse o seguinte: «Amanhã, todos teremos um pensamento pelas mulheres e pelos homens cobardemente abatidos».
Ao mesmo tempo que diz estas palavras, Macron vê republicadas as caricaturas do profeta Maomé e só tem uma coisa a dizer acerca desta republicação: não irei comentar a bem da liberdade.
Isto é mesmo um case study, ou, em português, um estudo de caso. Teoricamente poderíamos perguntar: é a liberdade um valor absoluto a ser respeitado nas sociedades ocidentais?
A resposta a esta pergunta não é, contudo, simples, mas é clara para mim. Eu tenho a certeza de que a liberdade não é um valor absoluto e não é considerada como valor absoluto nas sociedades ocidentais.
Vejamos a argumentação para se publicarem as caricaturas de Maomé. Em primeiro lugar, há desde há mais de cem anos a liberdade de blasfemar, quer dizer, de dizer afirmações contrárias à fé. Em segundo lugar, a liberdade de imprensa é inquestionável e, portanto, não se pode ferir a liberdade de se falar sobre o que quer que seja.
Todos compreendemos isto: temos de ter a liberdade de emitir as nossas opiniões pessoais, mesmo que contrárias à fé de cada um e temos de ter a liberdade de expressar essas mesmas opiniões na esfera pública.
Mas é mesmo isto que está em causa? É mesmo o direito de opinar contra a fé de alguém? É mesmo o exercício de liberdade de imprensa que está em causa? A minha resposta é clara: não!
Façamos um exercício. O que está a ser publicado no jornal satírico Charlie Hebdo toca na identidade religiosa de um povo, de uma religião, de milhões de pessoas.
O que permitimos ao Charlie Hebdo fazer em relação à religião, não permitiríamos que fosse feito por exemplo em relação à identidade sexual ou à raça de cada homem.
Dou um exemplo. O Presidente Emmanuel Macron não fez qualquer comentário à republicação das caricaturas de Maomé, apesar de ferirem a identidade religiosa de uma parte dos habitantes da França.
E se em vez de se fazer uma caricatura de um profeta de uma religião se fizesse uma caricatura a satirizar a identidade sexual de um determinado grupo de pessoas? Será que Emmanuel Macron não tomaria uma posição?
E se em vez de se satirizar uma religião se satirizasse uma raça? Será que não mereceria o repúdio de uma sociedade face ao gozo, à sátira que se pudesse fazer de uma pessoa só porque nasceu com uma cor da pele diferente de todos os outros?
No fundo, tudo isto é uma cobardia. Abater pessoas só porque satirizam a união de uma religião à violência é cobardia.
Não defender uma religião ao se unir numa sátira a religião à violência, é também cobardia.
Tudo isto é uma insanidade!
É cobardia não se defender o ataque satírico a uma raça! É cobardia não se defender o ataque satírio a uma identidade ou opção sexual! Como é, também, cobardia não se defender a opção de religiosa de quem quer que seja.
Não sou muçulmano! Não pretendo, nunca, converter-me ao Islamismo! Não concordo com aqueles que pretendem impor uma determinada fé à força da espada, porque a fé é uma força de atração de amor e não de violência.
Mas só posso censurar toda e qualquer publicação em imprensa, televisão ou mesmo digital que não respeite os valores e crenças daqueles que são diferentes de mim.
Não se distanciar das publicações satíricas do Charlie Hebdo é clara cobardia! Porque não há liberdade onde existe violência e o Charlie Hebdo, neste caso, como em muitos outros, usa de violência. Os fundamentalistas que estão a ser julgados são tão cobardes como aqueles que publicam este tipo de caricaturas.