Depois de seis longos meses com as crianças em casa já muitos pais tinham saudades da escola. E já nem se lembravam do preço a pagar por aquelas horas de tranquilidade por deixarem os filhos bem entregues.
Começa tudo de manhã: ou somos acordados demasiado cedo pelos mais pequenos ou ainda estão a dormir e parte-nos o coração acordá-los. E desde este primeiro passo, tudo se passa a correr. Ainda não têm um olho aberto e já estamos a querer que bebam o leite enquanto lhes enfiamos a camisola pela cabeça e insistimos com os mais velhos para que se vistam. Nenhuma idade é boa para estas manhãs insanas. Nem mesmo a nossa. Se os mais novos fazem birras por tudo e por nada, os mais velhos entram numa inércia – muitas vezes natural e compreensiva àquelas horas da manhã – e levam muito mais tempo do que desejaríamos a despacharem-se. Ainda têm de crescer um bocadinho e às vezes mesmo um bocadão, para perceberem que o tempo de manhã desaparece rapidamente, até se esgotar. Talvez nunca seja tempo suficiente, porque também não queremos acordar demasiado cedo ou porque as aulas às vezes começam cedo demais. Lá se foi o confinamento em que cada um acordava à sua hora, em que não havia pressa e se podia viver devagar. Quantos mais filhos se tem, mais complexa a corrida: fazer e dar o pequeno-almoço, trocar fraldas, vestir, procurar óculos e chuchas, sapatos, lancheiras, mochilas, pentear, lavar dentes, lavar a cara, lavar as mãos, esperar que saiam da frente do espelho e finalmente sair de casa.
Voltámos ao ritmo alucinante e muitas vezes as crianças mal saem da cama já estão porta fora mais ou menos penteadas e aprumadas – e mesmo assim sentimos que demorámos muito. Quando terminamos a primeira prova, suspiramos de alívio e iniciamos uma outra: o trânsito. Tal como nós, centenas de outros pais saem naquela altura de casa e encontramo-nos todos no trânsito, seja de carro ou nos transportes. Passado poucos minutos, muitos começam a protestar, a fingir que não veem os outros para passar de fininho ou não dar prioridade e lá vamos de nervos em franja a ver os minutos a passar para os deixar nas escolas a horas. Chegados à meta são os carros em segunda fila, mais a fila que se forma de prevenção da covid, que forma aglomerados de pessoas à porta, muitas vezes no meio da estrada e por último, no caso dos mais pequeninos, o choro, os braços que não querem deixar de abraçar, o pedido para os trazermos connosco, para não os deixarmos ir. E lá voltamos nós, de coração pequenino, a arrastar-nos até ao carro para começarmos um novo dia de trabalho.
Na segunda parte do dia saímos a correr de onde estivermos para os irmos buscar, muitas vezes em horários desencontrados. A vontade que tínhamos de os reencontrar, muitas vezes desvanece-se com birras de saudade e cansaço ou lutas entre irmãos. Outras vezes dali ainda vão para atividades extracurriculares onde os temos de ir pôr e ir buscar para, finalmente chegados a casa, iniciarmos um novo ciclo: banhos, pijamas, brincar, trabalhos de casa, fazer e dar o jantar, preparar roupas, lancheiras e mochilas, ler a história e finalmente deitar.
Os dias não deviam começar nem terminar assim. Mas bem feitas as contas, é um preço bastante baixo a pagar pelo regresso à escola.