O Montepio estreou uma linha de comunicação com uma campanha do produto crédito habitação. Um produto relevante, na medida em que se antecipa uma reativação do setor imobiliário. Já o mesmo não se pode dizer da campanha. O anúncio de televisão é um sketch do Bruno Nogueira no tom e registo que lhe são mais confortáveis: ele mesmo, irónico e provocador. Na história, sobra pouco espaço para falar da marca Montepio ou para fazer uma apresentação do produto. A parceria com a Worten, um argumento que diferencia a oferta da marca das dos seus concorrentes, é pouco mais do que um apontamento.
A colagem de uma marca a uma personalidade, sobretudo quando não representa um personagem, é sempre um caminho arriscado. Funcionou, por exemplo, no caso do MEO com os Gato Fedorento ou no do Cristiano Ronaldo com o BES. Mas o Montepio não é o MEO, nem o BES. Relações como estas custam muito a construir e passam por vários momentos.
Após esta estreia, surgem duas dúvidas: será esta a campanha que a marca precisa e se esta fórmula criativa é suficientemente flexível para transmitir outro tipo de mensagens.
Relativamente à primeira questão, as notícias que circulam sobre a instituição são tudo menos animadoras: encerramento de balcões, despedimentos, resultados negativos na associação mutualista, suspeitas relativamente à gestão e aos gestores. Nenhuma marca passa incólume por um cenário destes, qualquer que seja a sua reação.
O Montepio é uma instituição única. É a marca da maior associação mutualista do país, que há mais de 175 anos cuida das famílias portuguesas, é(ra) sinónimo de economia social. A caixa económica, o banco, serve a associação mutualista, à qual pertence. Apesar dos muitos esforços para que fosse percebido como qualquer outro banco, particularmente na vertente de retalho, as pessoas sempre consideraram o Montepio uma proposta diferente.
A pandemia tornou-nos mais atentos e solidários, à medida que os problemas sociais foram sendo mais evidentes, assim cresceram os esforços para os colmatar. Era o momento para o Montepio se evidenciar. Não o fez. Agora, com a desconfiança instalada, a ser falado pelos piores motivos, o Montepio tenta captar clientes para o crédito habitação, normalmente o maior compromisso financeiro que assumimos ao longo da vida. Recorre ao humor para passar essa mensagem e estabelecer ou reforçar uma relação de confiança.
Uma coisa é certa, o Montepio já não é o que era. O banco do pelicano, onde os avós constituíam a primeira poupança dos netos, levando para casa um mealheiro e uma caderneta, acabou. Protagonistas com a visão e consciência de Silva Lopes desapareceram. O banco, outrora com uma reputação protegida pela sua natureza, está agora tão exposto como qualquer outro. As pessoas desconfiam da atividade da banca e dos banqueiros. A comunicação do Montepio não tenta reverter nenhum destes dois aspetos.
Ninguém estava à espera desta campanha, o que poderá somar alguns pontos extra na avaliação da recordação. À marca, a campanha não acrescenta muito. Talvez nada. Mas será que ninguém estava à espera de que o Montepio ficasse debaixo do holofote com todas as questões em que está envolvido? Não, disto já estávamos todos à espera. Ninguém está à espera é que esta campanha consiga fazer alguma coisa por isso.