Money, money, money

O ordenado mínimo português é um atentado à dignidade humana. Ninguém deveria receber tal ninharia em troca do seu trabalho. Mas talvez seja apenas o meu ponto de vista. Afinal, pagar tão pouco a quem faz tanto não tira o sono a nenhum patrão. 

Os franceses consideram-se os mais sacrificados do mundo em relação aos impostos. Criticam certos países onde os contribuintes fogem à sua responsabilidade. Apontam o dedo aos governos permissivos e chamam ladrão ao do seu país. Reconhecem que sem dinheiro não há Estado, mas consideram inaceitável o sacrifício individual em prol do bem-estar coletivo.

Os gauleses são conhecidos mundialmente como râleurs (estão constantemente a queixar-se de tudo). Desta vez, as suas lamúrias têm razão de ser. Os últimos dados da OCDE só vêm confirmar o que quase todos os que aqui trabalhamos sabíamos. França é o segundo país do mundo onde os trabalhadores são obrigados a pagar mais impostos. Pior, só mesmo na Bélgica. No que diz respeito aos encargos patronais a França tem mesmo a medalha de ouro.

Portugal aparece a meio da tabela nos dois gráficos. No nosso país os impostos não são tão elevados como alguns tendem a apregoar. Os salários é que são vergonhosamente baixos. O ordenado mínimo português é um atentado à dignidade humana. Ninguém deveria receber tal ninharia em troca do seu trabalho. Mas talvez seja apenas o meu ponto de vista. Afinal, pagar tão pouco a quem faz tanto não tira o sono a nenhum patrão. E se alguém se questionar, a culpa é do Governo. Como sempre.

Parece que já estou a adivinhar os argumentos dos chefes das PMEs. Isto para não falar nas microempresas que se espalham como cogumelos, mas já nascem com uma data de validade curta. Muitas vezes é praticamente impossível sobreviver no meio de tantas obrigações fiscais e burocracia. Nisso sim somos campeões! Muitos patrões fazem prova de resiliência e criatividade para evitar fechar as portas no final do mês. Outros preferem exibir o carro com mais cilindrada e o smartphone de última geração. Paga o justo pelo pecador.

Os funcionários públicos exigem, todos os anos, um aumento salarial. Ainda assim, não são os mais sacrificados. Os dados oficiais demonstram que a função pública nacional tem um salário médio superior ao de outros países da OCDE. Uma vez mais, o Estado português exige um esforço sobre-humano à esfera privada para custear o excedente de mão-de-obra pública.

Dizem os entendidos na matéria que a atual situação económica não é a mais favorável para se mudar de trabalho. Quem tem um emprego deve preservá-lo ciosamente. Decidi desafiar as leis da Providência, essa deusa da Roma Antiga com a capacidade de prever as coisas que são boas, as que são ruins ou simplesmente as que não são nada. Como a sorte sorri aos audazes, mas sobretudo a quem se esforça, consegui. Mudei de trabalho, de área profissional e de cidade. Não sem apreensão e algum receio. Sair da zona de conforto nunca é fácil, mas conseguir dar o passo não tem preço.

Pela primeira vez, nas várias entrevistas que fiz, perguntaram-me o salário bruto desejado. Confesso que foi-me difícil apresentar um valor. Até há pouco tempo essa questão nunca era colocada porque o montante apresentado era sempre líquido. A carta dolorosa com os impostos pagos a peso de ouro chegava no final das férias do verão. A rentrée já começava com um sabor agridoce. A partir de janeiro de 2019, o Governo francês quis copiar o modelo de outros países e criou o prélèvement à la source (retenção na fonte). O imposto é automaticamente deduzido mensalmente. Dei por mim a fazer contas de lápis e papel porque a diferença entre os dois salários é abismal. Passei a entender o sofrimento dos meus compatriotas cada vez que olham para o seu recibo de vencimento. Ainda por cima não são abrangidos pela lei das 35 horas semanais, mais uma invenção da gauche caviar!