A incerteza teima em não desandar. Já nem os especialistas arriscam a fazer prognósticos. Vivemos ao ritmo do vírus. Analisamos a contagem diária dos casos confirmados, das camas disponíveis nos hospitais, dos milhões gastos numa vacina que ainda não provou a sua eficácia. Confiamos (?) nas decisões dos governos, fazemos contas à vida. Arregaçamos as mangas para a segunda vaga.
Muitos ainda sobrevivem graças ao layoff. Até quando? Ninguém sabe. Outros aprenderam a transformar a sala em escritório e as plataformas como o Zoom e o Skype passaram a ser os melhores aliados nesta tentativa de produzir alguma coisa à distância. No Luxemburgo, quase metade da população está habituada a trabalhar em casa. Mas não é o caso de tantos outros países onde a cultura do trabalho coletivo está bastante enraizada.
No meio de um cenário carregado de dúvidas há uma certeza quase absoluta: a covid-19 já nos venceu. Vivemos aterrorizados. O medo controla as nossas vidas. Perdemos esta guerra virológica ainda antes dela começar. Falhamos na antecipação, não levamos a sério o inimigo. E não me refiro apenas à desorganização logística nos hospitais, à incoerência inicial em relação ao uso das máscaras, ao abandono dos velhos nos lares. Obviamente, houve quem soubesse agir atempadamente e Portugal foi melhor aluno do que o país onde vivo. Sem dúvida!
E enquanto alguns ainda se estão a adaptar à nova realidade a OMS já alertou que o pior está por chegar e exige medidas mais firmes no combate ao vírus, principalmente no velho continente. A segunda vaga já começou e ainda não estamos preparados. Parece que a mensagem foi eficaz porque a resposta de alguns líderes europeus não se fez esperar.
14 de outubro foi dia de discurso para o Presidente francês, exatamente quatro meses após a sua última intervenção. Macron apareceu em direto na televisão para dar a conhecer a nova fase do estado de emergência. Adotou uma postura séria. A hora é grave. Apelou à solidariedade e insistiu que, sem união, não é possível vencer o vírus. Entre as várias ações apresentadas destacam-se:
- Teletrabalho duas a três vezes por semana (caso seja possível);
- Reuniões privadas limitadas a seis pessoas (em espaços públicos ou privados);
- Aumento do número de testes e resultados mais rápidos;
- A aplicação numérica ‘Tous Anti Covid’ substitui a desastrosa ‘StopCovid;
- O uso de máscara é fortemente recomendado ‘a toda a hora e em todo o lado’, inclusive na esfera privada (algo que já acontece de maneira quase generalizada).
Os franceses são insubordinados e não digeriram de ânimo leve alguns sacrifícios exigidos por Macron. As duas semanas de férias escolares vão ter um sabor agridoce. São muitos os que aproveitam esta interrupção para visitar familiares, mas a impossibilidade de circular entre as zonas vermelhas obriga-nos a permanecer na região onde vivemos. Não me posso queixar, a Bretanha tem muito para oferecer.
Mas se há uma medida que gerou polémica foi, sem dúvida, o recolher obrigatório das 21h00 às 06h00 na região de île-de-France (onde se situa Paris) e nas metrópoles de Grenoble, Aix-Marseille, Lille, Toulouse, Montpellier, Rouen, Lyon e Saint-Étienne. Todos os que não cumprirem sujeitam-se a uma multa de 135 euros.
Os gauleses consideram esta obrigação um atentado às liberdades individual e coletiva. Algo semelhante não ocorria desde a Segunda Guerra Mundial quando a população tinha que respeitar o ‘couvre-feu’ por razões de segurança. Era uma questão de vida ou de morte. Nem sempre os fins justificam os meios. Esta decisão ainda vai fazer correr muita tinta. Ficamos à espera das cenas do próximo episódio. Até lá, muitos ficam em casa.