França voltou a confinar-se. Regressamos a casa com uma sensação de déjà vu. O confinamento vai durar até 14 de dezembro, mas os pessimistas dizem que o melhor é esquecermos o Natal em família. Está praticamente tudo parado. As únicas exceções são o comércio considerado essencial, algumas indústrias, a agricultura e os estabelecimentos de ensino (com exceção das universidades). As crianças a partir dos seis anos são obrigadas a usar máscara e todas as deslocações exigem uma derrogação. Desta vez, o confinamento promete ser agitado. Macron tenta, como pode, controlar o fogo nas várias frentes, mas chega tarde. A casa já está a arder.
Crise sanitária
Os números oficiais são assustadores. Há mais de 50.000 novos casos e quatro centenas de mortes por dia. O Governo teve conhecimento das projeções dos especialistas no início de setembro, mas foi incapaz de agir atempadamente. As equipas médicas estão saturadas e os hospitais estão à beira de um colapso. Faltam recursos humanos, camas e ventiladores.
Crise económica
Muitos dos comércios encerrados correm o risco de não voltarem a abrir portas. Aos que já tinham sido anteriormente sacrificados juntam-se agora as salas de teatro e de cinema e as livrarias. Este também é um annus horribilis para a cultura. Nas grandes empresas as ajudas financeiras não são suficientes e os despedimentos em massa não se fizeram esperar.
Crise política
O Governo está cada vez mais isolado. Alguns maires desobedeceram aos decretos oficiais e mantiveram abertos os comércios considerados não essenciais, mas vitais para a saúde da economia. Macron tem dificuldade em libertar-se do seu passado antes de chegar à política e gere o país como se fosse um banco. Mas esquece-se que a França não é a família Rothschild.
Crise social
O país está a ferro e fogo e a tolerância é zero. A pátria das manifestações não se pode queixar. Neste momento, há para todos os gostos: os anti-máscaras, os anti-confinamento, os que se recusam a fechar restaurantes e cafés, os de extrema-direita, os pró-Arménia, os ‘Loups gris’ (movimento ultranacionalista turco), os que proíbem os filhos de frequentar a escola…
Crise diplomática
Macron estava longe de imaginar que umas caricaturas de um jornal satírico, medíocre nas palavras e nos desenhos, dariam origem a uma guerra aberta à tão proclamada liberdade de expressão. Erdogan encabeçou o boicote aos produtos franceses e a sua ação foi aplaudida e seguida por outros países muçulmanos. Na Síria, Líbia, Paquistão, Iraque, Líbano queimam-se bandeiras tricolores e espezinham-se fotografias gigantes com a cara do presidente gaulês. O apoio dos membros europeus foi discreto, talvez com medo que o acordo entre cavalheiros se rompa. Ninguém está interessado em receber os milhares de migrantes que estão retidos na Turquia em troca de avultadas quantias de dinheiro e promessas políticas.
Ameaça terrorista
França nunca deixou de estar na mira dos fanáticos. Desde o início do ano, já ocorreram seis ataques, embora nem todos tenham direito a destaque internacional. Para tentar combater os bárbaros que degolam e cortam cabeças, supostamente em nome de Allah, Macron enviou mais de 7.000 militares para a rua. Uma panaceia insuficiente para um inimigo impiedoso e que não tem nada a perder. O terrorismo é um problema estrutural que não tem sido levado a sério pelos dirigentes europeus. Os membros do Governo francês devem estar a rezar a todos os santinhos para que nenhum louco se lembre de matar os mais vulneráveis que saem de casa todos os dias: as crianças.