Os tempos que estamos a viver não são fáceis para ninguém. Há um isolamento progressivo das pessoas nas suas casas e um medo crescente pelas notícias ininterruptas sobre as infeções e o aparecimento de novos casos em Portugal e no estrangeiro.
Às vezes, pelas notícias que são dadas, parece que metade da população está a morrer nas últimas 24 horas. Porém, não é verdade! O facto de ouvirmos muitas vezes, nas notícias sucessivas, os mesmos números dá-nos a sensação de um colapso geral do mundo sobre nós.
De facto, a perceção que temos do mundo, da sociedade, das relações e de nós próprios está a mudar. Uma das coisas que me preocupam é a nossa relação com os nossos amigos e familiares durante este tempo. Pode parecer parvoíce, mas quem não tem saudades de poder beijar alguém para cumprimentar? Ou quem não tem saudades de um grande abraço de um amigo?
O facto de não podermos visitar os nossos no hospital ou em casa, quando estão doentes, também nos afeta de uma forma incrível. Na realidade, os momentos de doença são para nós momentos de que precisamos para podermos estar numa relação com as outras pessoas e fazem parte da nossa relação progressiva de despedida dos que irão morrer.
Também a situação em que se encontram aqueles que estão doentes sem poderem receber visitas atira-os para uma situação de solidão que ninguém pode suprir. É verdade que em todos os hospitais há profissionais, enfermeiros, médicos, auxiliares que, antes do mais, são pessoas, e não máquinas, a tratar dos doentes. Mas também é verdade que, para eles, o trabalho técnico não pode ser substituído.
No fundo, há uma solidão enorme que se vai abater sobre nós! Um manto enorme de silêncio e de solidão cobre-nos com estes confinamentos! O medo vai-nos dominando os nervos e não nos deixa fazer o que nos é próprio como seres humanos: entrar numa relação de amor!
São tempos excecionais, estes que estamos a viver! São tempos que exigem também uma força interior excecional. Como diria Santo Agostinho, cada um de nós terá de ir buscar forças ao «íntimo mais íntimo de nós mesmos» para se manter equilibrado e mentalmente são.
Não sei como a maioria das pessoas que não têm fé cristã conseguem aguentar estes tempos, mas eu penso que se não fosse a relação amorosa que Deus estabelece no meu íntimo mais íntimo, já há muito teria entrado numa angústia sem retorno.
Agora, parece que está na moda na Igreja haver uns conselheiros de luto ou o que é isso! Parece que se vão preparar uns técnicos para acompanhar as pessoas para aceitarem a morte.
Eu, sinceramente, não faço a mínima ideia do que sejam conselheiros de luto!
Nós estamos a destruir o maior valor que temos na Igreja Católica. Criamos estes conselheiros de luto para ajudarem as pessoas a fazer o seu luto. Criamos uns homenzinhos para acompanharem os funerais aos cemitérios. Criamos estruturas e mais estruturas para acompanhar as pessoas nas mais diferentes situações de vida.
Isto são coisas boas e interessantes. Mas o que nos é próprio é a pregação do Evangelho de Cristo, que morreu por nós e ressuscitou ao terceiro dia.
É a fé em Jesus Cristo que nos prepara para a morte. O problema é que os cristãos e os padres – e não quer dizer os bispos, que também já foram padres – não têm a sua fé fundada na morte e ressurreição de Cristo.
Sem termos a nossa fé centrada neste acontecimento central, que nos enche de uma esperança enorme na vida eterna, temos de criar estas estruturas paralelas que ajudem as pessoas a meterem remendos nas suas vidas quando chegam os momentos de sofrimento.
Quando existe a pregação do Evangelho, a vida que temos de nós e do mundo muda completamente e vivemos cheios de esperança.
Talvez nestes tempos que se aproximam nos deveríamos perguntar realmente o que devemos fazer para voltarmos a pregar esta palavra que ajudou tantos homens e mulheres a viver, habituados a uma esperança que não tem fim, e deixarmos que os psicólogos e os técnicos façam o seu trabalho especializado.