Face à vitória do democrata Joe Biden, o trumpismo saiu à rua num protesto em Washington, este fim de semana. Compareceram milhares de apoiantes de Donald Trump vindos de todos os cantos do país, incluindo elementos da extrema-direita e ícones das teorias da conspiração, exigindo a reversão dos resultados eleitorais. O sábado começou com protestos pacíficos, mas acabou com uma noite de escaramuças entre os Proud Boys, um grupo de extrema-direita que Trump foi acusado de apoiar, e contra-manifestantes. Uma pessoa foi esfaqueada, dois agentes da polícia feridos, houve dezenas de detidos, segundo as autoridades locais.
O próprio Presidente passou pelo protesto, acenando de polegares para cima dentro da sua SUV blindada, atravessando uma multidão onde se viam muitas bandeiras e poucas máscaras.
“Não durmo desde a eleição, porque estou triste que Donald Trump não é o nosso Presidente”, lamentou ao Guardian, Craig Johnson, que conduziu 14 horas desde a Florida até à capital, onde distribuiu notas de dólar estampadas com a cara da mulher de Trump, Melania. Rapidamente se corrigiu. “Ele vai ser o nosso Presidente”.
“Apesar de o poderem negar, há uma crescente sensação de uma luta a perder a sua energia”, escreveu Will Grant correspondente da BBC em Washington. “E de que, gostem ou não, estes apoiantes de Trump verão o Presidente eleito Joe Biden na Casa Branca em janeiro”.
Cada vez mais esse cenário parece certo. Biden já tem bem mais que os 270 votos que precisa no colégio eleitoral, e os boletins de voto que a campanha Trump contesta não chegam para virar nenhum estado. Mesmo elementos do círculo próximo do Presidente, incluindo a primeira-dama e o seu cunhado, Jared Kushner, já lhe pedem que aceite os resultados, segundo a CNN, enquanto boa parte da liderança republicana se mantém fora da refrega.
Até o Presidente mostra falta de confiança, parecendo reconhecer pela primeira vez a derrota. “Ele ganhou porque a eleição foi manipulada”, tweetou Trump, este domingo. Após um funcionário da Casa Branca afirmar à NBC que talvez fosse o princípio de uma admissão de derrota do Presidente, este acrescentou: “Eu não aceito nada!”.
Seja como for, tudo indica que o trumpismo está aqui para ficar, com mais ou menos esperança, num país cada vez mais dividido. Mesmo acossado por uma pandemia que matou 250 mil americanos, devastando a economia, o Presidente obteve quase 73 milhões de votos – foi o segundo candidato mais votado da história, à frente de Barack Obama e atrás de Joe Biden.
“O enorme apoio que Trump continuou a receber expõe a ‘alma’ da América como aquilo que é”, argumentou o investigador Andre Perry, do Metropolitan Policy Center, num artigo para a Brookings. “Deveria obrigar-nos a refletir nas crenças, sistemas e práticas políticas que levaram à sua eleição. O apoio a Biden é prova suficiente que a América não é como Trump, mas Trump ainda representa uma boa parte da América”.