Após uma cimeira-maratona, os chefes de Executivo europeus desbloquearam a aprovação do quadro orçamental até 2027 e do Fundo de Recuperação, num total de 1,8 biliões de euros, após ameaças de veto da Hungria e da Polónia, furiosas com o mecanismo de proteção do Estado de direito incluído no pacote. «Ultrapassámos o impasse e temos agora os meios para vencer a crise social e económica», tweetou o primeiro-ministro português, António Costa. Á semelhança de Costa, boa parte dos líderes europeus suspiraram de alívio. Já os Governos da Hungria e da Polónia proclamavam vitória alto e bom som, enquanto a sua oposição interna lamentava a cedência.
«O acordo de hoje é uma decisão de empurrar o orçamento para a frente e, tristemente, o mecanismo do Estado de direito foi sacrificado. É quase inexistente agora», lamentaram a Hang, uma associação de direitos humanos húngara, e a Akcja Demokracja, uma associação polaca, em comunicado conjunto.
Na prática, as alterações ao mecanismo de Estado de direito aceites pelos líderes europeus implicam que a cláusula que tornava alguns fundos dependentes do respeito pelo Estado de direito fica quase sem efeito de momento – a Hungria e a Polónia já prometeram que desafiarão as medidas no Tribunal Europeu de Justiça, num futuro próximo.
Além disso, o mecanismo do Estado de direito deixará de poder tocar assuntos sociais, como direitos LGBT+, ao aborto e à migração – alguns dos principais motivos de queixas de abusos dos direitos humanos na Hungria e na Polónia. «Defendemos os interesses da Hungria. O dia D foi um sucesso!», declarou o primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán.
Contudo, para muitos foi um sacrifício necessário, face à crise económica causada pela pandemia. «O acordo de hoje mostra que o bom senso triunfa sobre o egoísmo. Com este pacote económico, a Europa pode emergir poderosa desta crise», assegurou o ministro das Finanças alemão, Olaf Scholz.
Para outros, essa crise era apenas outro motivo pelo qual se sentiam seguros de que Hungria e Polónia acabariam por ceder. «O dinheiro destes fundos de recuperação é tanto e nós estamos em tão má forma económica que eles não arriscariam não o aceitar», explicou ao Guardian Adam Bodnar, que dirige uma das poucas agências de direitos humanos que mantêm a sua independência na Polónia.