por Filipa Moreira da Cruz
Nasceu na Póvoa do Varzim, assistiu à inauguração do canal de Suez, visitou a Palestina e foi cônsul de Portugal em Havana, Newcastle, Bristol e Paris. Viveu 12 anos na capital francesa e morreu em Neuilly sur Seine, em 1900. Os franceses chamam-lhe o Balzac ou o Flaubert português. Mas Eça de Queiroz era um caso à parte. Único na sua escrita, mestre de uma prosa elegante, idiomática e internacional. Integrou a Geração de 70, numa ânsia de modernizar o Portugal agrário. Foi precursor do realismo e as suas obras são, ainda hoje, extremamente pertinentes e atuais.
Nasceu em Lisboa, no dia 13 de junho, mas os seus primeiros poemas foram escritos em inglês. Durante muito tempo, foi nesta língua que manifestou o seu caráter pouco convencional e a sua melancolia. Fernando Pessoa viveu na África do Sul e foi estrangeiro no seu próprio país. Refugiou-se no álcool e morreu antes de cumprir os 50, vítima dos seus excessos. Admiro o escritor, o tradutor exaustivo, o homem inconformado, o poeta. E revejo-me quando afirma que «nunca um verdadeiro português foi português: foi sempre tudo».
Maria Helena Vieira da Silva nasceu no mesmo dia que Pessoa e ambos partilham-no com a data da celebração do mais internacional santo português. Viveu na Suíça, no Brasil e em França. Foi em Paris que passou a maior parte da sua vida, juntamente com o seu marido Árpád Szenes. Mas nem tudo foram rosas na trajetória pessoal da pintora. Por duas vezes, o Estado português recusou a nacionalidade portuguesa a ambos os artistas. Apátridas e exilados no Rio de Janeiro, só em 1956 obtiveram a nacionalidade… francesa! Foram condecorados em França, em 1960, mas o reconhecimento em Portugal só chegou após a revolução de Abril. A artista nasceu portuguesa e morreu francesa, em Paris.
Casou com uma jornalista espanhola, ganhou o Prémio Nobel da Literatura e viveu numa ilha europeia mais perto de África que do velho continente. Não escolheu Lanzarote por acaso. Decidiu isolar-se porque estava zangado com o mundo. Quando vivi nas Canárias visitei a sua casa e senti bem firme a presença do escritor português que recusou várias vezes a nacionalidade espanhola. Crítico da sociedade capitalista e atento às injustiças sociais, Saramago usou a palavra para condenar o abuso do poder e dar voz aos invisíveis.
«O mundo real começa quando saímos da nossa casa para encontrar os outros». A frase é de Eduardo Lourenço, um dos últimos livres pensadores do nosso país. Viveu na Alemanha, em Itália e em França. Casou-se com uma bretonne em Dinard (cidade que adoro e que é vizinha daquela onde vivo atualmente). Aposto que Annie Salamon era uma mulher com muito caráter, como quase todos os habitantes da Bretanha. O casal rumou ao sul do país onde permaneceu até 1988, ano que marcou o regresso a Portugal. O filósofo teve uma vida longa e intensa. E nunca virou as costas à Nação que o viu nascer.
A ministra da Cultura, Graça Fonseca, disse que Portugal está em dívida com Eduardo Lourenço. Atrevo-me a dizer que o ensaísta talvez não tenha sido o mais mal tratado. Muitas vezes, os homens políticos, arrogantes e obstinados com o poder, esquecem-se das personalidades ímpares que puseram Portugal no mundo. Sabem que a vida é efémera, mas ignoram que a obra dos esquecidos é imortal.