Quando a famosa nova variante do SARS-CoV-2 – apelidada com o pouco sonante nome de VUI-202012/01 – foi encontrada no Reino Unido, dezenas de países acorreram a fechar as portas aos britânicos, mas provavelmente foi tarde demais, avisam cada vez mais especialistas. A nova variante do vírus já foi encontrada um pouco por todo o planeta, de países europeus como a Holanda, Dinamarca, Bélgica, mas também em Israel e na China.
Até é bem possível que a variante nem sequer tenha surgido no Reino Unido, mas apenas sido detetada lá. Afinal, o país tem o mais sofisticado programa de monitorização genómica – 5% a 10% dos casos de covid-19 no Reino Unido são alvo de sequenciação genética, para perceber a variante do vírus em causa na infeção, quase metade dos dados recolhidos em todo o mundo.
Importa lembrar que, apesar do SARS-CoV-2 ter taxas de mutação muito mais baixas que outros vírus, como o da gripe, é perfeitamente normal e esperado que um vírus mute. O que chamou a atenção foi o ritmo com que esta variante o fazia, muito mais rapidamente que o comum, tomando conta do sul de Inglaterra – terá sido responsável por mais de metade dos novos casos nas últimas semanas, segundo as autoridades de saúde britânicas.
«Há tantos vírus a circular, com tantas mutações potencialmente interessantes que, para percebermos o que é mais importante, temos alguns indicadores, nomeadamente ver aqueles que se espalham muito depressa», explicou esta semana ao João Paulo Gomes, responsável pelo estudo da diversidade de vírus e bactérias no Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, ao jornal i.
Até agora, não há indicadores que mostrem que a nova variante cause doença mais grave, mas preocupam os indícios de que poderá ter mais facilidade em infetar crianças. Além disso, os alarmes disparam sempre há mutações no espigão da SARS-Cov-2, como é o caso da VUI-202012/01. É que este espigão é pequena peça de maquinaria proteica que permite infiltração do vírus em células humanas – também é o alvo de todas as vacinas desenvolvidas contra a covid-19.
Mais uma vez, a variante é tão recente que ainda não se sabe se terá efeito na eficácia da vacina. Mas farmacêuticas como a Pfizer e a BioNTech apressaram-se a assegurar que, caso isso acontecesse, conseguiriam alterar a sua vacina em seis semanas. Contudo, o problema não é só técnico – para não ter de voltar a ensaios clínicos, teriam de ter aval das autoridades de saúde, que da última vez demoraram quase um ano.
«Teríamos de lidar com a questão de como é que a EMA [Agência Europeia de Medicamentos], a FDA [agência reguladora dos medicamentos nos EUA] e outras autoridades veriam isso», admitiu o diretor-executivo da BioNTech, Ugur Sahin, em conferência de imprensa.
Contudo, o que não faltam são ameaças. Paralelamente à variante do vírus descoberta no Reino Unido, foi encontrada outra mutação na África do Sul, alvo de restrições às viagens de cada vez mais países. Aqui, o perigo é outro. Os cientistas verificaram que os infetados por esta variação tinham uma carga viral mais elevada no trato respiratório superior – algo associado a sintomas mais graves noutras doenças.