Domingo é dia de Super Bowl, a final do campeonato de futebol americano que opõe os Tampa Bay Buccaneers e os Kansa City Chiefs. É o maior evento desportivo nos Estados Unidos, com uma audiência estimada de cerca de cem milhões de pessoas, contabilizando a dos canais digitais. É o espaço publicitário mais caro do mundo.
Este ano vamos assistir um Super Bowl atípico. Vai ter público, mas a ocupação não deverá chegar a metade da capacidade do estádio, estando altamente desaconselhados ajuntamentos de pessoas para acompanharem o jogo em grupo. Estes dois fatores poderão contribuir para um aumento da já enorme audiência que vai seguir o jogo. No estádio, vai ser a assistência mais baixa da história do evento.
Trinta segundos no intervalo do SuperBowl custam mais de cinco milhões de dólares e, todos os anos, quarente a cinquenta marcas, em média, apostam neste momento. É o espaço que muitas empresas, nomeadamente do setor automóvel, bebidas e empresas tecnológicas, usam para estrear os seus anúncios. Produções à americana, celebridades, música, animações e bichinhos a fazerem coisas engraçadas, o intervalo do Super Bowl é o último bastião da publicidade do antigamente, da era pré-digital, quando a comunicação era pensada para televisão, em filmes de trinta segundos no meio de outros. Estrear um anúncio no Super Bowl é, por si só, um fator distintivo. É o maracanã da publicidade.
Pelo intervalo do Super Bowl passaram algumas das campanhas mais marcantes de todos os tempos. Uma das que ficou para a história como das melhores de sempre, foi a da Apple em 1984. A representação da realidade distópica imaginada por Orwell é destruída por um martelo lançado por uma atleta, vestida de vermelho e branco, num ambiente em que tudo, das pessoas à imagem, é cinzento. Este anúncio, cuja mensagem era 1984 não vai ser como 1984, anunciava a chegada do Macintosh, um produto que ia mudar o mundo, o computador que toda a gente podia usar. O realizador foi um tal de Ridley Scott. Curiosamente, este anúncio não agradou à administração da companhia o que fez com que vendessem um dos dois espaços que tinham comprado. Mas bastou um para mudar a história da publicidade. É a partir deste momento que o intervalo do Super Bowl ganha o estatuto que hoje em dia tem.
No próximo domingo vão ser emitidos alguns dos principais – e mais caros – filmes publicitários do ano, apesar de todas as adaptações às características do evento que o contexto impõe. A transmissão televisiva vai ganhar ainda mais importância, mas, por outro lado, acontece em muito mais canais, ou seja, apesar de um previsível crescimento das audiências temos de lidar com a certeza da distribuição em múltiplos canais. É bom ter mais gente a ver, mas em termos publicitários a dispersão da transmissão por vários canais, sobretudo no ambiente digital, não é necessariamente uma vantagem para os anunciantes. É na concorrência do digital que reside a maior ameaça ao espaço mais caro do mundo.
Claro que o digital há muito que faz parte do espetáculo do Super Bowl. Sem ter o impacto que 1984 teve para a história da publicidade, em 2013 durante uma falha de luz a Oreo fez um tweet com o copy You can still dunk in the dark. A ação, uma publicação no Twitter no momento mais oportuno, foi o momento de comunicação mais falado nesse ano, destronando as quarenta ou cinquenta marcas que compraram o espaço mais caro do mundo. Custou uma equipa de redes sociais a acompanhar o evento, algo que muitas marcas, quase todas as que anunciam no Super Bowl, hoje em dia têm em permanência. Mas em 2013, uma era distante em que o iPhone 5 era novidade, a gestão de redes sociais ainda era diferente do que é hoje e com muito menos recursos para conseguir acertar nas pessoas, momentos e conteúdos certos.
Hoje, além das várias aplicações disponíveis para acompanhar o jogo, muitas delas com o streaming em direto, há várias formas para potenciar o impacto do evento à distância. A tecnologia permite criar experiências, recorrendo por exemplo à realidade virtual ou aumentada, que igualam vários momentos da experiência verdadeira. E se estas experiências estavam reservadas a alguns privilegiados, possuidores de tecnologias que lhes permitiam o acesso, hoje essa barreira praticamente não existe. Este ano é uma espécie de prova de fogo, consequências das circunstâncias que condicionam a proximidade física, que pode resultar na afirmação do digital como o principal canal para acompanhar o evento. Se acontecer, é provável que se escreva sobre o tema mas, em vez do minuto, vamos destacar o clique mais caro do mundo.