Por Filipa Moreira da Cruz
Há uns dias, a minha filha quis saber qual a atividade que mais desejo retomar quando este semi-confinamento terminar. Sem hesitar, respondi: ir ao cinema. Reconheço que sou antiquada. Quase ninguém vai ao cinema. Também vejo filmes através da internet, mas a sensação não é a mesma. Nada substitui a emoção do grande ecrã. Tenho a sorte de viver num país com uma longa história cinematográfica. Ou não fossem os irmãos Lumière conhecidos como ‘os pais do cinema’’’
Neste momento, a escola está fechada para férias e aproveitamos para ver um filme depois do jantar. Desta vez, cabia ao meu filho escolher, mas a Mathilde não se deu por vencida. Tinha já um título em mente e persuadiu o irmão a apoiar a sua ideia. Demain tout commence, pela terceira vez! Um filme com Omar Sy, o ator favorito da minha filha.
No dia seguinte, era eu a decidir. A pedido do meu filho, optei por Pelé: O nascimento de uma lenda. Ninguém se opôs. O meu marido achou graça às escolhas, interpretando-as como um sinal. Sem sabermos, reavivamos-lhe a memória. Recordou tempos que parecem fazer parte de outro século. Na altura, não pensei muito no assunto.
Quando estamos de férias, o pequeno-almoço dura uma eternidade. Crepes, batido de fruta, torradas… A primeira refeição do dia parece um brunch. E há tempo para tudo! Até mesmo para ouvir as histórias do pai. E foi o que aconteceu, quando nos voltou a contar que, no mesmo ano, conheceu o Pelé e o Omar Sy, em dias diferentes e em cidades distintas.
Edson Arantes do Nascimento deslocou-se a Paris na Primavera de 2014 para inaugurar uma exposição dedicada ao desporto rei e ficou alojado num hotel no centro da capital, o mesmo onde o meu marido trabalhava. Mas ele não ficou muito empolgado porque detesta futebol, ao contrário de mim. Ironias da vida! Ainda assim, o reencontro com a estrela brasileira foi emocionante. O antigo jogador quando soube que a mulher do responsável era portuguesa falou todo o tempo na nossa língua. O meu marido acompanhou-o, o melhor que pode, e quando o Pelé lhe pediu um ‘chazinho’ o Sébastien traduziu, orgulhoso, aos colegas. Se há uma coisa que eu bebo é chá! Depois de uma grande lavagem ao cérebro, consegui convencê-lo a tirar uma fotografia ao lado da lenda do futebol. Guardo, com orgulho, esse cliché onde aparecem os três: O Pelé, o Sébastien e a taça.
No verão desse mesmo ano, mudamo-nos para San Sebastian, no País Basco. No final de setembro a cidade acolhe o Festival de Cinema e, em 2014, o filme em destaque era Samba, dos mesmos realizadores do magnífico Intouchables. Omar Sy e Charlotte Gainsbourg ficaram hospedados no hotel mais luxuoso e emblemático de Donostia, o novo local de trabalho do meu marido. Durante três dias, o Sébastien partilhou piadas com o ator francês que ficou encantado por saber que alguém falava a mesma língua que ele. Desta vez, não pedi nenhuma fotografia. Não quis abusar da sorte! Além disso, o meu marido poderia ganhar coragem e perguntar à filha de Gainsbourg se não se importaria de pousar ao seu lado para uma selfie.
Às vezes, tenho saudades desses tempos. A vida era tão ligeira! Restam-me as recordações. Felizmente, não são poucas. Quando for velhinha, contarei aos meus netos os encontros, recheados de anedotas, com as estrelas de cinema, os cantores, os escritores, as figuras políticas internacionais… Será que eles vão querer saber como conheci o Brad Pitt, em 2009? Talvez não. Mas, posso dizer-lhes, que numa outra vida, existiu um grupo francês chamado Daft Punk, cujos dois músicos não reconheci, quando me cruzei com eles, porque não tinham os famosos capacetes, claro!