Por Nélson Mateus e Alice Vieira
Querida avó,
Hoje é Dia Mundial do Teatro. Todos os anos, para comemorar a data, realizam-se vários espetáculos teatrais gratuitos ou com bilhetes mais baratos e são relembrados alguns artistas e obras mais importantes da história do Teatro. O objetivo da data é promover a arte do Teatro junto das pessoas.
Mas este ano nada disso acontece. Aliás, ao longo deste ultimo ano, a Cultura tem sido bastante massacrada. Os Teatros ou estão fechados ou trabalham a 50%.
Como muitos ganham uma percentagem da bilheteira, tem sido um flagelo para empresários, atores, técnicos e tantas famílias que dependem do Teatro.
O Teatro é uma arte milenar e funciona como um meio de divulgação da cultura.
Já ouvi tantas vezes a Eunice Muñoz falar dos avós que pertenciam ao Teatro, assim como os avós da Manuela Maria com quem andava de terra em terra.
Existem vários géneros teatrais como a comédia (a falta que tu e as pessoas mais velhas devem sentir do Parque Mayer), o drama, a farsa, a tragédia, a revista, o teatro infantil, entre outros.
Todos dizem que o Teatro Monumental era lindíssimo. Mas ninguém melhor do que tu (que durante a tua infância percorrias tudo o que é Teatro desde os clássicos à revista), para falares de Teatros extintos, dos atores de outros tempos que não devem ser esquecidos como: Laura Alves, Varela Silva, Palmira Bastos, Amélia Rey Colaço, Ivone Silva, Mário Viegas, ou encenadores como o Ribeirinho, o Vasco Morgado e tantos outros.
Não posso falar do Teatro sem referir a grande obra que é a Casa do Artista, um sonho tornado realidade pelo Raul Solnado, o Armando Cortez e tantos outros como a Carmen Dolores que morreu recentemente. O último reduto de dignidade numa atividade desregulada e instável. A Casa onde: «É Proibido Envelhecer».
Não te esqueças de mudar a hora. Deves adiantar o relógio uma hora.
Gosto tanto do horário de verão.
Viva o Teatro!
Querido neto,
Nem imaginas a falta que o teatro me faz. Nunca me lembro de mim sem ver teatro. Tive muita sorte, por duas razões: o tio que me criava adorava teatro; e também porque nessa altura não havia classificações dos espetáculos, como depois houve. Todos podiam ver tudo.
O meu tio era muito eclético: nunca faltava a uma estreia no Teatro Nacional, nem a uma estreia nos teatros do Parque Mayer. E eu sempre com ele. E no fim dos espetáculos, largava-me da mão e eu entrava nos bastidores para ver aqueles atores todos. E eles tinham imensa paciência para mim… A Amélia Rey Colaço, minha amiga até ao fim da sua vida, tal como a Marianinha (como sempre chamei à Mariana Rey Monteiro), a D.Palmira, a Lurdes Norberto, e tantos outros.
E sim, faz-me imensa falta o teatro de revista e todos os amigos e amigas que lá fiz: o Zé Viana, a Beatriz Costa, a Leónia Mendes, a Helena Tavares, e tantos outros. A Beatriz Costa ensinou-me imenso, nas tardes que passávamos no Hotel Tivoli onde ela vivia.
Lembro-me que, quando acabei o curso na Faculdade de Letras, muitos dos atores que fui conhecendo assinaram as minhas fitas da pasta para a Queima das Fitas. E é por isso que o Ruy de Carvalho está sempre a dizer que somos amigos de infância….
Ah, e também nunca falhávamos um espetáculo no Monumental, um teatro (e cinema) lindíssimo.
Lembro-me que o teatro abriu com um espetáculo chamado As Três Valsas; e o cinema com o filme O Facho e a Flecha.
E gosto tanto de teatro que já escrevi duas peças: Leandro, Rei da Helíria, e Um Anjo de Barbas. E o meu livro Graças de El’ Rei Tadinho foi adaptado ao teatro e representado pelo TIL durante meses e meses.
E só para terminar: uma das coisas que recentemente me deu mais prazer foi ver o Teatro Aberto apresentar a peça E Toda a Cidade Ardia, encenada pela Marta Dias, baseada na minha vida.
(Já mudei os relógios todos para o horário de verão).
Viva o Teatro!