Um dia destes uma amiga contava-me como a irritava o facto de alguns pais partilharem, nos grupos de WhatsApp das turmas dos filhos, fotografias pessoais e de acontecimentos familiares. Pais que, na sua maioria, nem se conhecem. Em plena pandemia, enquanto ela estava em casa sem mãos a medir entre os filhos e o teletrabalho, as fotografias das famílias perfeitas iam surgindo: muito felizes a fazerem doces, a passear, a fazer jogos e brincadeiras, aos abraços a sorrir em casas fantásticas, etc. Sempre houve estas famílias ‘perfeitas’, que gostam de ostentar a sua perfeição, mas com a facilidade de comunicação e envio de dados elas proliferaram. Há uns anos jamais passaria pela cabeça de alguém tirar uma fotografia aos filhos, revelar e enviar pelo correio a um desconhecido. Hoje em dia em segundos pode tirar a fotografia e enviar a milhares de desconhecidos sem qualquer constrangimento. A questão é para quê.
Acredito que muitos destes pais não o façam com má intenção, mas é no mínimo estranho partilhar com estranhos fotografias de momentos privados em família. Seja por que razão for, que não se apoquente quem sente ter a pior família ou ser o pior pai do mundo, com os piores filhos do mundo e o pior casamento do mundo, quando vê estas fotografias. Não passam de momentos felizes, que com maior ou menor frequência, todos temos. Todos às vezes temos mais disponibilidade, estamos mais bem dispostos e os nossos filhos portam-se como anjos. Mas não há ninguém que viva nesse idílio constantemente.
Há vários tipos de famílias ‘perfeitas’: umas mais felizes do que outras, umas mais disponíveis, umas com mais bens materiais, outras com menos, umas mais unidas, umas maiores, outras mais pequenas, umas mais serenas, outras mais ansiosas, umas mais confusas e barulhentas, umas mais funcionais do que outras. Mas em comum todas as famílias ‘perfeitas’ têm a característica de se preocuparem, de fazerem o melhor que sabem e conseguem e de quererem que todos os seus elementos sejam felizes. Uma família ‘perfeita’ é aquela em que os seus elementos têm espaço para a alegria, mas também para a tristeza e para a zanga. Em que são unidos e estão ligados por fortes laços de amor e amizade, mas em que cada um sente que tem espaço para si e que é respeitado pelos outros. Que cresce em conjunto, mas sabe que cada um pode ser quem quiser. Em que os pais são os pilares – juntos ou separados – e os filhos se sentem amados e protegidos.
Posto isto, não sei se as famílias perfeitas existem verdadeiramente, mas uma coisa é certa, se existirem bastam-se a si e não precisam da admiração de estranhos para se sentirem realizadas.