Luís Rouxinol, um dos cavaleiros de maior sucesso em Portugal, costuma tourear mais de 40 corridas por ano. O ano passado, devido à pandemia, entrou apenas em seis espetáculos. «Foi um ano terrível para os toureiros e para todas as famílias que vivem da tauromaquia. Tenho aguentado com muitas dificuldades», diz ao Nascer do SOL o cavaleiro tauromáquico.
As touradas deverão regressar no início de maio, na próxima fase do plano de desconfinamento, mas os efeitos da pandemia têm sido brutais. «Estimamos que a pandemia tenha tido um impacto no setor da tauromaquia à volta dos 50 milhões de euros», revela Hélder Milheiro, porta-voz da Federação Portuguesa de Tauromaquia – Protoiro.
Os números são claros e revelam uma descida significativa no número de corridas e de espetadores. Em 2020, em que a tauromaquia teve de cumprir as restrições impostas pela pandemia, realizaram-se apenas 42 espetáculos com pouco mais de 66 mil pessoas a assistir.
Se olharmos para os últimos anos, de acordo com o relatório da Inspeção Geral das Atividades Culturais (IGAC), realizaram-se anualmente cerca de 180 corridas com aproximadamente 400 mil espetadores. Contas feitas, houve uma «quebra superior a 75%, o que é um valor muito elevado», diz Hélder Milheiro.
O relatório da IGAC classifica o impacto da pandemia como «muito significativo em toda a atividade cultural e, naturalmente, com efeitos negativos bastante elevados para os espetáculos tauromáquicos, quer pela inviabilização de muitos, quer pelas fortes restrições que se impuseram aos que tiveram lugar».
A organização de uma corrida de toiros envolve mais de 170 pessoas entre artistas, ganadeiros ou bilheteiros. Os cavaleiros tauromáquicos são dos mais afetados, porque continuam a ter encargos com os cavalos e viram as receitas reduzir drasticamente. Em média, um cavaleiro gasta cerca de dez mil euros por mês com as equipas que os acompanham e na alimentação e cuidado dos animais.
Luís Rouxinol tem mais de vinte cavalos e admite que «é uma despesa brutal». O cavaleiro tem conseguido manter a equipa, mas confessa que «se isto não desconfinar começa a ser muito complicado manter todos os funcionários».
Hélder Milheiro também traça um cenário preocupante se a situação não se inverter nos próximos meses. O porta-voz da Protoiro destaca que «há cavaleiros que normalmente toureiam 40 corridas e tourearam o ano passado oito ou dez». Ou seja, «a queda é enorme. Estamos a falar de despesas muito avultadas e de receitas muito reduzidas. Isso está a deixar a situação no setor bastante insustentável».
A ministra que não gosta de corridas de toiros
A polémica à volta das touradas também não ajuda. Os defensores da tauromaquia queixam-se frequentemente de ser discriminados pelo Governo. Os aficionados voltaram este ano a manifestar-se à porta da Praça de Toiros do Campo Pequeno em protesto contra a decisão da tauromaquia só retomar depois de outras atividades culturais.
Francisco Rodrigues dos Santos, presidente do CDS, marcou presença na manifestação do dia 22 de abril. «Este setor tem sido violentamente perseguido pela ministra da Cultura», disse, em declarações à TSF, Rodrigues dos Santos. O PSD também saiu em defesa da tauromaquia e acusou Graça Fonseca de «estar a impor o seu gosto pessoal» e a ceder «à pressão de grupos radicais minoritários» na sociedade portuguesa.
Relações tensas com Governo
No dia em que os aficionados se reuniram para protestar contra a discriminação do Governo, Graça Fonseca garantiu, numa entrevista ao Diário de Notícias, que «os equipamentos culturais não abriram todos em simultâneo» e o plano de desconfinamento aponta para o regresso das touradas a partir do dia 3 de maio.
A relação entre a ministra e o setor da tauromaquia foi tensa desde o início, mas Hélder Milheiro garante que nos últimos meses «houve uma evolução que tornou possível criar uma relação que não existia» desde que Graça Fonseca assumiu o cargo. «Passou a haver reuniões frequentes, troca de informação, o que registamos de uma forma positiva», acrescenta.
As associações ligadas à tauromaquia apresentaram um conjunto de propostas para a reparação do setor. A retoma da atividade com a lotação de 50% em todas as praças de toiros, aumentando a lotação assim que possível, o cancelamento da realização obrigatória de testes aos forcados ou a descida da taxa de IVA dos espetáculos tauromáquicos para 6% são algumas das ideias apresentadas ao Governo para ultrapassar os impactos causados pela pandemia.
Hélder Milheiro não esconde que a evolução favorável da pandemia permite estar mais otimista e espera que sejam revistas as restrições em relação ao público a partir do verão. «Aquilo que queremos é trabalhar e ter mais público. Esperamos ter uma temporada com o dobro de espetáculos».
O plano para a retoma da atividade apresentado pela Federação Portuguesa de Tauromaquia reivindica também a «transmissão de cinco espetáculos tauromáquicos em 2021 através do canal público de televisão (RTP), promovendo a cultura portuguesa e permitindo o acesso da população à mesma, numa lógica de serviço público». O regresso de um programa de tauromaquia à RTP2, que existiu até 2012, é outra das reivindicações. A RTP transmitiu apenas uma corrida de toiros na última temporada.
O assunto poderá mesmo ser discutido na Assembleia da República durante esta legislatura. O BE apresentou um projeto de lei para que as touradas só possam ser transmitidas entre as 22h30 minutos e as 6 da manhã e com bolinha vermelha.