Ninguém fica indiferente a notícias trágicas sobre crianças, como a da bebé de dois anos que ficou esquecida no carro na semana passada. Sobretudo quem tem filhos recebe-as com angústia e muitos preferiam nem ter conhecimento delas. O que é natural. As crianças são como anjos, na sua inocência e ingenuidade, pelo que não há quem não se comova com uma fatalidade destas. É uma tragédia!
O que me desconcerta e preocupa são as pessoas, muitas delas também mães, que, sem saberem pormenores – o que não devia ser necessário – não só não se compadecem e solidarizam com alguém que perdeu um filho, como ainda a atacam sem dó nem piedade. Quando vi a notícia não queria acreditar na quantidade de comentários cruéis que se lhe seguiam. Havia até quem pedisse justiça. Que justiça? Que maior castigo pode uma mãe ter do que perder o próprio filho? Que justiça há nisso? Felizmente estas mães a quem a vida muda o rumo de forma tão irreparável não precisam do perdão de desconhecidos. Ou não deviam precisar. Mas sobretudo do seu próprio, que será também, inevitavelmente, o mais difícil.
Ao apontarem o dedo a uma mãe que cometeu um erro que tem consequências a uma dimensão destas, parecem estar a querer provar que não se enquadram naquele tipo de pessoas, querem deixar bem claro – para elas e para os outros – que são pessoas absolutamente responsáveis e atentas incapazes de incorrer num erro destes. Ou querem obrigar-se a acreditar que o são, passando a si próprias um atestado de competência ou superioridade.
Eu não penso assim. Pelo contrário. Quando vejo notícias destas penso que, com um grande azar, algo semelhante poderia acontecer à maioria das pessoas.
Esta mãe, por exemplo, não será mais irresponsável ou negligente do que todas as que deixaram esses comentários agressivos. Deve ser uma mãe não muito diferente de todas as outras, que faz o melhor pelos seus filhos, que se lhes dedica e que os ama incondicionalmente, mas que, por alguma razão, teve o enorme azar de cometer um erro que teve a pior consequência possível. Isso faz dela a pior mãe do mundo? Não. Faz dela a segunda maior vítima deste enorme acidente. E dá-nos a oportunidade de refletir sobre as vidas que temos, muitas vezes de correria, em piloto automático, com tantas tarefas sobrepostas agendadas na cabeça que muitas vezes as vamos cumprindo sem pensar muito. Sem nos apercebermos que já transportamos uma carga demasiado pesada.
Quanto a estas pessoas que deixam comentários condenatórios fazem-me pensar na sociedade em que nos estamos a tornar. Que perante o sofrimento do próximo, em vez de lhe estender a mão lhe atira pedras, a condena em praça pública, em vez de compreender, olha de cima e reprova. Uma sociedade pouco solidária. Que ataca, critica, condena, aponta o dedo e segue caminho sem olhar para trás.
A mãe desta criança não terá essa sorte. Este dia jamais vai ser esquecido. Vai retornar a ele demasiadas vezes. Espero que nunca caia no erro de ler todos aqueles comentários odiosos e que tenha a sorte de ter perto de si quem a compreenda e apoie neste novo caminho que a sua vida tomou.