Um dia fiz com os meus filhos mais pequenos um foguetão com um grande caixote de cartão. Cortámos, pintámos, colámos um botão para a descolagem, sentaram-se lá dentro e… um dos meus filhos perguntou-me se o foguetão ia mesmo levantar voo.
Ser criança é não ter limites, é acreditar que tudo é possível. É ir experimentando e com o tempo ir percebendo até onde se consegue ir. É viver intensamente com todos os sentidos bem despertos: é estar atento aos pormenores, ver o que não vemos, sentir os cheiros mais subtis, os sons mais longínquos, as peles mais macias. É sentir o sabor da fruta. É ficar feliz com o presente mais simples, rir com as nossas piores piadas, levarem-nos às lágrimas com as suas gargalhadas mais sinceras.
Ser criança é acreditar em nós, pais, acima de tudo, ver-nos como deuses, capazes de qualquer coisa, confiar que se nos derem a mão estão livres de qualquer perigo, acreditar que um beijinho nosso cura realmente um dói-dói. E cura! Porque eles acreditam.
É ter medo do escuro porque ele pode ser povoado por bruxas e maus que saltam da sua imaginação para o quarto.
Ser criança é ter bicho-carpinteiro e pilhas Duracel. É ser irrequieto e inquieto, é correr e saltar o dia inteiro sem ficar cansado. Pormos a mão sobre o seu peito e sentirmos aquele coração pequenino a bater tão depressa que nos faz perceber como ainda são tão frágeis.
Ser criança é ser bondoso. É ser amigo. É dar a mão aos avós acreditando que assim eles não vão cair. É ir a um parque e falar com os outros meninos como se já os conhecesse. É perdoar sem saber sequer o que isso é. É não guardar rancor. É correr para um amigo que não se vê há muito tempo e abraçá-lo com todo o amor. É ter o prazer de descobrir a amizade pela primeira vez. É adorar os seus amigos, estar desejoso de brincar com eles, ficar triste quando se vão embora ou quando lhe dirigem palavras feias.
Ser criança é ser inocente. De uma ingenuidade comovente, que o tempo vai acabando por levar.
Ser criança é ser corpo e mente num só. É responder energicamente quando estão felizes ou zangados, é levantar a voz proporcionalmente ao entusiasmo.
Ser criança é ser sincero, mesmo quando não se diz a verdade.
É saber e gostar de brincar e quase nada lhe dar tanto prazer quanto isso. É ter uma imaginação sem limites. É gostar de inventar, ser curioso, querer aprender e conhecer. É precisar de amor, atenção, colo e segurança todos os dias.
Ser criança é um privilégio de que só nos apercebemos quando deixamos de o ser. É ter a capacidade de pôr um adulto a ser criança outra vez. Ou a descobrir a criança que nunca deixou de ser. Não os apressemos a crescer, a sair deste estado de graça, deixemos que possam ser crianças o tempo que for preciso.
Eu tenho a sorte de ter cinco crianças em casa. Todas diferentes, cada uma mais especial. Que me fazem viver os momentos mais doces e fantásticos e também os mais desesperantes. Que me lembram todos os dias que os foguetões de cartão também voam, não só até ao espaço, mas até onde quisermos ir.