Por Pinto Moreira, Presidente da Câmara Municipal de Espinho, e Pedro Louro, Comandante dos Bombeiros Voluntários de Espinho
Nos últimos anos, muito por força dos acidentes ocorridos nos grandes incêndios rurais e pela elevada participação no sistema integrado de emergência médica, o desempenho das missões dos bombeiros tem sido alvo de um escrutínio público, técnico e académico mais aprofundado, evidenciando o que há́ muito parecia ser óbvio. É necessário refletir e mudar o setor, pois o nível de desempenho exigido parece ser incompatível com um modelo apoiado de sobremaneira em recursos humanos voluntários, com baixo financiamento público do estado central, com um arbitrário financiamento das autarquias locais e ainda com uma duplicação de estruturas desprovida de fundamento operacional que se traduz em desperdício, dispersão de apoios e que compromete o desenvolvimento do próprio setor.
A mudança estrutural que se impõe não pode, em momento algum, ser feita de forma desligada dos municípios, o primeiro patamar do sistema de proteção civil e aquele em que os corpos de bombeiros estão organizados.
Em Portugal continental existe um total de 442 corpos de bombeiros, distribuídos por 278 municípios. Em 85 dos municípios coexistem 241 desses corpos de bombeiros.
Acredita-se que, em contraponto com a realidade atual, a existência de apenas um corpo de bombeiros por município, independentemente do número de quartéis necessários para assegurar tempos de intervenção aceitáveis numa determinada área geográfica, a par do estabelecimento de protocolos de cooperação com os respetivos municípios que estabeleçam níveis de desempenho e responsabilização sérios, são mudanças estruturais catalisadoras da racionalização de recursos, da melhoria do serviço prestado à população e, já agora, de um setor mais organizado, a menos vozes, mais uniforme na velocidade e na trajetória e com menos assimetrias territoriais.
Por outro lado, sendo a atividade deste setor uma constante no quotidiano da sociedade, 24 horas por dia, não é aceitável que esteja assente na volátil disponibilidade de recursos humanos, sobretudo no que toca à primeira intervenção, responsável pela resolução da maioria das ocorrências e por conter a gravidade das situações ao intervir de forma célere, com meios adequados e pessoal rotinado.
Os Bombeiros do Concelho de Espinho deram o exemplo e foram o primeiro e único caso de fusão de dois corpos de bombeiros e associações do país, que coexistiam na mesma rua, a menos de 400 metros, num território com apenas 21Km2. O processo estendeu-se ao longo de quase 10 anos, mas os ganhos alcançados para todos valeram o esforço. Inauguraram um novo quartel no passado dia 8 de maio, profissionalizaram grande parte dos recursos humanos nos últimos cinco anos e dispõem de um modelo de financiamento plurianual, que lhes permite um elevado desempenho e que lhes assegura a necessária estabilidade e sustentabilidade.
Assim, em nome da eficiência, da eficácia, da competência e da boa gestão de recursos, quer humanos quer materiais, a fusão de corpos de bombeiros nos territórios municipais deve ser um desígnio deste ou de outro Governo, da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil e das Autarquias Locais. Mas, para que tal aconteça, esta alteração de paradigma deve ser estimulada e incentivada, nomeadamente através de um novo quadro jurídico favorável, de uma majoração atrativa do financiamento central, do compromisso das autarquias locais em modelos de apoio estruturais e não pontuais ou circunstanciais, e ainda por critérios de prioridade no acesso a quadros de financiamento nacionais ou comunitários para equipamentos, veículos ou instalações.
A bem do serviço prestado aos portugueses e do próprio setor dos bombeiros, o caso exemplar de Espinho não pode ser filho único. Este contributo exemplar à reforma do setor precisa de ser apoiado para ser replicado. Todos saem a ganhar.