Ao longo do nosso processo democrático (1974/2021) temos assistido por diversas e sucessivas ocasiões a intervenções ‘espúrias’ e laterais de militares, tentando – ou mesmo forçando – a alteração ao normal funcionamento das instituições democráticas.
Analisemos, com brevidade, as mais importantes e significativas.
1982
Aprovação da Lei de Defesa Nacional das Forças Armadas
Após a Revisão Constitucional que pôs fim ao Conselho da Revolução, cujo processo foi carregado de incidentes, esta Lei fundamental foi finalmente aprovada, vencendo o veto do então Presidente da República (PR) e Comandante Supremo, Ramalho Eanes.
No período de governação Soares/Mota Pinto foi finalmente institucionalizado o Ministério da Defesa Nacional, mas outros incidentes existiram, dos quais destaco o triste episódio da exoneração do então Chefe do Estado-Maior do Exército (CEME) general Garcia dos Santos, em que a disputa Ramalho Eanes vs Mário Soares, tendo sido levada ao extremo e ao ridículo, expressou bem o sentimento e o objetivo daqueles que, escondendo-se por trás de Ramalho Eanes, se opunham ao normal funcionamento da (então jovem) democracia.
1990/1994
Reforma Defesa Anos 90
Data deste período a primeira Reforma da Defesa Nacional e das Forças Armadas, visando reposicionar o aparelho militar e a estrutura da Defesa Nacional através de três ‘alavancas’ de ação – Redimensionar, Reestruturar e Reequipar –, com realismo e de acordo com as capacidades e potencialidades do país, atendendo ao ambiente internacional e em concordância com os designados Interesses Nacionais Permanentes.
Nesta altura Mário Soares já era PR,mas rapidamente esqueceu tudo aquilo que lhe tinham feito quando era primeiro-ministro. Com efeito, apesar das expressivas maiorias dos Governos de Cavaco Silva, os ‘mesmos’ voltaram à ação e, os incidentes e ‘tragédias’ sucederam-se com escandaloso e despudorado aproveitamento e utilização da instituição militar, por parte do Comandante Supremo Mário Soares.
1995/2011
Com ligeiras e curtas interrupções foi o período em que os socialistas (Guterres e Sócrates) exerceram o poder democrático legítimo. Os ‘mesmos de sempre’ usaram ou criaram inúmeras oportunidades para intervir com as suas teses, quantas vezes enviesadamente e sem recurso aos debates agora reclamados. Criaram entropias e opuseram-se a quaisquer alterações relevantes, pois estas, sendo adequadas à conjuntura nacional e internacional, nunca poderiam por em causa interesses corporativos, ou ambições pessoais que então se tornavam evidentes… que o digam os ministros Veiga Simão, Severiano Teixeira e Santos Silva. O esplendor desta ação concertada e despudorada atingiu o seu auge em 2009.
2011/2015
Reforma Defesa 2020
Trata-se da segunda grande reforma que foi concebida e implementada no Governo Passos Coelho. O seu acerto e relevância é atestado pelo facto de ainda estar publicada por completo no site do Ministério da Defesa Nacional do atual Governo (já o terceiro desde o início da Reforma). Todos ali a podem consultar, analisar e julgar.
Novamente a ação dos ‘mesmos’ veio à superfície e as pressões voltaram ao nível habitual, sendo os processos, métodos e linhas de ação sempre os mesmos.
Pressionar, baralhar, adiar e, como num jogo de cartas… quando a mão não é boa… deitar o jogo abaixo… baralhar e dar de novo, contando aqui já com alguma amnésia por parte de Cavaco Silva (por ora ainda não tanto como Soares… mas, pelo caminho que vem seguindo, lá chegará).
2021
Perante um cirúrgico e circunstancial aperfeiçoamento e clarificação de leis já existentes voltou o ‘fantasma’ das reformas.
Reparem bem, reformas dignas desse nome houve duas em quarenta anos. Decorreram no lugar adequado – Assembleia da República – e foram propostas por governos democráticos após amplos debates na sociedade civil (como é sobejamente reconhecido e fácil de confirmar).
Felizmente nestes dois casos está tudo escrito e publicado, para que quem as queira conhecer, estudar, apreciar e debater o possa fazer com rigor e verdade.
Infelizmente hoje entre nós o rigor é cada vez menor, a memória é inexistente e os hábitos de leitura perderam-se.
Em retro análise procuremos respostas para as seguintes questões:
– Se a passividade nos tivesse permitido continuar como seriam hoje as Forças Armadas de 1975/80?;
– E, como o seriam se tivéssemos continuado com o Serviço Militar Obrigatório e prosseguido com os modelos de recrutamento, admissão e gestão de carreiras que então existiam?;
– O que seriam se o Sistema de Forças continuasse vocacionado para fazer face ao ‘inimigo’ ali ao lado?;
– O que seriam com planos de reequipamento que só eram possíveis quando ultrapassavam os interesses corporativos dos Ramos?
Poderíamos discriminar muitas outras situações e apresentar inúmeras questões aos ‘mesmos’, que são sempre contra… mas isso ficará para outra altura e situação que não na ‘praça pública’.
Então e como vai a vida?
(Continua no próximo número)