por Judite de Sousa
1.Nos ciclos históricos, o período de 50 anos é tido como a duração temporal indispensável para que sejam produzidas avaliações sólidas e consistentes sobre factos e protagonistas. É a margem necessária para que exista um distanciamento que permita aos historiadores análises aprofundadas, tanto quanto a Nova História o permite, à luz dos estudos que marcaram as primeiras décadas do século XX. Dito isto, só agora é possível pensar analiticamente a revolução de Abril de 1974 e o movimento dos militares que a protagonizou, conduzindo o país para a transição democrática com o fim de meio século de ditadura. É certo que o país e os portugueses devem honrar essa memória histórica, principalmente pelas conquistas de Abril; uma expressão que pouco dirá às novas gerações mas que tem que ser estudada nas suas dimensões política, económica e social.
A História é feita de vencedores. Os derrotados preenchem poucas linhas. Há um sentimento de identidade e pertença para quem ousa e conquista. Daí até à glorificação do personagem é um instante na construção da memória coletiva.
Na narrativa de Abril, Otelo Saraiva de Carvalho foi um protagonista de primeira linha. Porém, não soube ou não quis preservar o seu legado de revolucionário pela causa das liberdades e da democracia. Otelo falhou na caracterização de si próprio. Otelo não esteve à altura da revolução. Manchou de sangue o seu lugar no movimento dos capitães de Abril ao envolver-se e liderar as FP-25, associando-se a crimes contra a vida humana. A História já o julgou. Otelo não foi um herói.