É indiscutivelmente um dos temas mais populares da história da música recente. ‘I will allways love you’, a canção interpretada por Whitney Houston no filme O Guarda-Costas, de 1992, é reconhecível a qualquer ouvido. Mas poucos sabem como esta música trouxe uma nova vida a uma comunidade nos arredores de Nashville.
Foi Whitney Houston quem integrou o elenco do filme e “imortalizou” a melodia com a sua vez inconfundível. Os números no Youtube não enganam: a sua versão foi vista 1.125 milhões de vezes. Porém, por trás deste êxito esconde-se a autoria de Dolly Parton, a rainha da música country, autora de outros êxitos memoráveis como ‘Jolene’ ou ‘9 to 5’. Trata-se de um daqueles casos – não tão raros assim – em que a “cópia” supera o original. A versão de Dolly Parton conta apenas seis milhões de reproduções na plataforma de vídeo digital.
Nem por isso a cantora country deixou de beneficiar com o estrondosa popularidade do tema. Parton contou recentemente o que decidiu fazer com os cerca de 10 milhões de euros – um valor que segundo cálculos da revista americana Forbes, à taxa de inflação, hoje corresponderia a cerca do dobro – que arrecadou em direitos de autor com o êxito de 1992.
No programa Watch What Happens Live da Bravo TV da passada quinta-feira, a cantora explicou o investimento feito num complexo de oficinas em Nashville, no estado do Tennessee, e como quis homenagear Whitney Huston, a mulher a quem considera dever toda essa fortuna. “Comprei uma propriedade ali, na que era uma zona negra da cidade. A maioria das famílias que ali viviam eram negras. Estava fora do caminho da famosa Avenida 16 e pensei logo em comprar aquele sítio”. A avenida 16 em Nashville é o epicentro da “Music Row”, como lhe chamam os locais, por ser um distrito onde estão instalados estúdios de vários artistas. “Pensei: este é o sítio perfeito para mim, pensando como se fosse a Whitney”, contou Parton, que explicou também como ficou encantada na altura com a sua própria decisão. “Vou-me envolver com a sua gente, que também é a minha gente. Adoro o facto de ter gasto todo aquele dinheiro num complexo naquele bairro. Hoje penso: “Foi esta a casa que a Whitney construiu”. O objetivo era revitalizar uma zona fora que se encontrava em declínio, fora de moda há mais de 30 anos.
Presença num bairro historicamente negro
Parton comprou o complexo em fevereiro de 1997, de acordo com registos de propriedade a que o Washington Post teve acesso. David Ewing, um historiador local de Nashville, disse ao USA Today que a contribuição de Parton aconteceu num momento em que a maioria dos artistas nem sequer consideraria aquele bairro para investir em imobiliário.
“É claro que a Dolly Parton poderia ter comprado uma propriedade em qualquer lugar em Nashville. Faria mais sentido ter comprado uma sala musical onde estivessem as grandes produtoras e os agentes musicais mais importantes. É realmente uma declaração de intenções que ela tenha querido comprar ali, bem antes do bairro se ter recheado de entretenimento, restaurantes e bairros residenciais”, explicou o historiador. E concluiu: “O facto de Dolly Parton ter uma presença neste bairro famoso historicamente negro é uma coisa incrível e de grande consideração”. A presença da estrela ajudou a regenerar o bairro e encorajou outros a investir.
Na realidade, este gesto não se tratou de um caso isolado, mas apenas um dos capítulos mais notáveis de um longo currículo de filantropia. A título de exemplo, no ano passado a compositora e cantora ajudou também a financiar pesquisa para a vacina contra o coronavírus com uma doação de um milhão de dólares.
Na verdade, Dolly Parton considera que está apenas a retribuir tudo aquilo de bom com que foi contemplada. Em novembro do ano passado contou numa entrevista a Oprah Winfrey o quanto se emocionou quando a ouviu pela primeira vez na rádio pela voz de Houston, enquanto conduzia. De tão nervosa que ficou, não conseguiu evitar as lágrimas e teve de parar o carro para poder escutar do início ao fim. “Não consegui acreditar como é que a Whitney fez aquilo. É tão bonito que a minha pequena canção se tenha tornado naquilo, foi um grande, grande acontecimento”.
Texto editado por José Cabrita Saraiva