O Chega propôs, esta quinta-feira, a constituição de uma comissão parlamentar de inquérito à atuação do Ministério da Administração Interna e das forças sob a sua tutela no caso do acidente que envolveu a viatura oficial do ministro Eduardo Cabrita, na A6, e que resultou no atropelamento mortal de um trabalhador, de 43 anos.
O partido liderado por André Ventura considera que o acidente, que ocorreu no passado dia 18 de junho, “não se encontra ainda devidamente esclarecido” e que tem sido “alvo de um aparente esquecimento que não dignifica o próprio Estado, nem respeita a memória da vítima e o acompanhamento devido à sua família”.
Na proposta entregue na Assembleia da República, a que o Nascer do SOL teve acesso, o Chega enumera as várias notícias que vieram a público sobre o caso, nomeadamente acerca da velocidade a que seguia a viatura ou da sinalização na estrada no momento do acidente, para frisar aquilo que considera uma “ausência de clarificação e concordância de versões” que ainda hoje estão por esclarecer.
Neste sentido, para que com “clareza” se compreendam todos os pormenores do caso, o Chega considera que se deve “apurar se houve ou não ordens para que não se realizassem as diligências habituais nestes acontecimentos pelas autoridades competentes”, “apurar se houve ou não interferência direta do Ministério da Administração Interna na atuação do INEM e da GNR, face às diligências que tinham, por lei, de realizar”, “apurar se houve ou não tentativa de responsabilizar indevidamente a vítima mortal do acidente e desresponsabilizar o ministro ou os seus funcionários no acidente” e, por último, “ esclarecer por que motivo continua o Ministério da Administração Interna a escudar-se no segredo de justiça para não prestar informações, quando o veículo envolvido no acidente era um veículo do Estado, transportando um governante e diversos funcionários sob a sua tutela”.
“Face à gravidade das dúvidas e factos mencionados e sobretudo à falta de informação sobre os mesmos, o CHEGA considera que é fundamental constituir uma comissão parlamentar de inquérito que permita alcançar respostas que definitivamente esclareçam as envolvências do acidente em causa, atendendo a que é obrigação inequívoca da Assembleia da República, no âmbito das suas competências de fiscalização, ser conhecedora na íntegra e esclarecidamente de todos os pormenores verificados”, lê-se no documento.
Assim, o partido liderado por Ventura propõe “uma comissão parlamentar de inquérito à atuação do Ministério da Administração Interna e das forças sob a sua tutela no caso do acidente de viação que envolvendo a viatura oficial do Ministro Eduardo Cabrita, atropelou mortalmente um trabalhador na autoestrada A6”.
Recorde-se que o caso em questão ficou marcado pelo silêncio inicial de Eduardo Cabrita e com vários pedidos de demissão por parte de alguns partidos. Depois do acidente mortal, o MAI emitiu um comunicado no qual sublinhou que não houve qualquer despiste e que “não havia qualquer sinalização que alertasse os condutores para a existência de trabalhos de limpeza em curso”. Segundo a tutela, “o trabalhador atravessou a faixa de rodagem, próxima do separador central, apesar de os trabalhos de limpeza em curso estarem a decorrer na berma da autoestrada”. Contudo, fonte da Brisa, responsável pela manutenção da estrada e que subcontratou a empresa Arquijardim, onde trabalhava a vítima, contrariou esta versão, garantindo que os trabalhos na A6 estavam devidamente sinalizados, cumprindo todas as regras de segurança.
Além do inquérito aberto pelo Ministério Público, também o INEM abriu um inquérito interno acerca do socorro prestado no referido acidente, depois de o médico António Peças, que presta serviço no hospital de Évora e na viatura médica de emergência e reanimação (VMER) do INEM daquela unidade hospitalar, ter recorrido ao Facebook para levantar dúvidas sobre o mesmo.
As notícias sobre o caso não paravam de chegar e o Nascer do SOL chegou a avançar que todos os testemunhos ouvidos indicavam que o carro em que seguia o ministro ia a mais de 200 km/h no momento do acidente.
Eduardo Cabrita viria finalmente a quebrar o silêncio no dia 2 de julho, à margem da cerimónia dos 154 anos da PSP, não esclarecendo, contudo, qualquer uma destas questões.
“Neste apuramento dos factos, entendo que não existe nenhum cidadão ou entidade acima do que é o quadro legal aplicável. O que não desejo a nenhum de vós e a ninguém é ver-se envolvido na qualidade de passageiro numa situação tão dramática como esta. E por isso gostaria de fazer um apelo, sem qualquer referência específica: que confiássemos naqueles a quem cabe apurar os factos e não transformássemos algo que é muito triste – no plano pessoal, jamais passei por algo similar – (…) numa matéria de confrontação política”, disse o ministro, que revelou ainda que a sua chefe de gabinete, no dia do acidente, telefonou à mulher do trabalhador a apresentar as condolências.
Questionado sobre se sentia que tinha condições para continuar no cargo, já depois de a oposição ter pedido a sua demissão, Cabrita colocava a responsabilidade nas mãos do primeiro-ministro, António Costa, que demonstrou não ter qualquer dúvida: Cabrita permaneceu no cargo.