A relação das tradicionais consultoras com as tradicionais agências de publicidade evoluiu muito nos últimos anos.
Numa primeira análise os negócios têm pouco em comum. Lidam com os mesmos clientes mas têm interlocutores diferentes e, mesmo quando abordam os mesmos desafios, o que sempre aconteceu, não atuam na mesma fase do processo. Numa leitura mais atual, a separação das duas atividades não é assim tão evidente.
Dados, tecnologia e criatividade, são os principais conceitos que aproximam o mundo das consultoras do das agências. Um dia serão indissociáveis. E esse dia pode não estar assim tão longe.
Os dados são a matéria prima dos dois negócios: quanto mais conhecimento tivermos sobre um determinado fenómeno, por exemplo um processo de compra, maiores são as potencialidades actuarmos sobre ele. Pela importância dos dados para o seu negócio e pelo tipo de utilização que fazem deles, agências e consultoras têm muito em comum, mesmo que em escalas completamente diferentes. Mas ambas precisam de dados para desenvolverem a sua atividade. Dados que recolhem nas mesmas fontes, que são tratados recorrendo a técnicas e ferramentas semelhantes. Têm ambas os mesmos objetivos, transformar dados, normalmente propriedade dos clientes, em conhecimento.
A tecnologia é o motor do processo. A era do paradigma da experiência do negócio, traduzido na partilha e entrega do mesmo acervo de valores e compromissos aos diferentes stakeholders em todos os momentos de interação com uma marca, só é possível com recurso a tecnologias. Em primeira instância, é o veículo que permite transformar o conhecimento, obtido e suportado por dados, em propostas de valor tangíveis. Depois, é a tecnologia que aumenta o impacto das experiências, transformando uma garrafa num jogo de computador ou dando a possibilidade de se fazerem as compras do mês no espaço de cinco minutos enquanto esperamos pelo autocarro.
A criatividade é uma competência. Como todas as outras, uns têm-na mais desenvolvida do que outros, pode ser treinada e desenvolvida. As agências de publicidade, commumente designadas criativas, têm muita propriedade sobre o termo. Têm o exclusivo da função (figura?) do criativo, que ora assusta ora apaixona os clientes. Mas o epíteto criativa não é exclusivo das agências, basta pensar em casos evidentes como a Tesla ou a Apple. As consultoras, quanto mais ferramentas têm ao seu dispor, mais se afastam de modelos pré definidos e apostam na criação de soluções inovadoras e personalizadas. O puzzle que constroem é quase sempre muito mais complexo do que o das agências, além de muitas vezes o fazerem ao mesmo tempo que escrevem as instruções para o montar. Sem criatividade e pessoas criativas, não é possível fazer este trabalho.
Há cerca de dois anos, a Accenture Interactive, a maior agência digital do mundo segundo a AdAge, comprou a Droga5. Ou seja, uma das maiores consultoras comprou umas das agências mais conceituadas do universo da criatividade (publicitária). Não foi a primeira nem a última aquisição que a Accenture faz de empresas neste setor.
Outras consultoras trilham caminhos semelhantes. Entretanto, David Droga, fundador e presidente da Droga5, foi nomeado durante esta semana o novo CEO e Creative Chairman da Accenture Interactive. O criativo mais premiado de sempre no festival de publicidade de Cannes e uma das maiores personalidades da comunicação comercial das duas últimas décadas, é hoje um dos principais gestores de uma grande consultora. Surpresa? Talvez, mas acima de tudo uma constatação de como duas realidades, à partida distintas, estão afinal tão próximas e interligadas.
Quando o trabalho está pronto, interessa pouco quem fez o quê perante a avaliação do produto final. Agências de publicidade, consultoras, qualquer empresa ou fornecedor, quer entregar soluções que permitam alcançar os melhores resultados possíveis, junto de todos os stakeholders relevantes. Tendo em vista esta necessidade, os clientes pedem uma estratégia a uma agência de publicidade com a mesma naturalidade que esperam ideias das consultoras.
Sempre foi assim, mudou o facto de hoje todos trabalharmos com as mesmas fontes de informação e ferramentas de análise. Unir esforços e tirar o melhor de cada um dos intervenientes parece uma solução óbvia para o crescimento sustentado do negócio. Pelo menos até agora tem sido.
Senior Manager da Accenture Interactive