Prevêm-se negócios da China no futuro dos talibãs

Pequim tem tudo a ganhar com o emirado, dos contratos de construção ao lítio.  

Depois dos sucessivos falhanços do império britânico, da União Soviética e dos Estados Unidos em controlar o Afeganistão, a China parece ser a potência seguinte a colocar o país sob a sua alçada. E parece talhada para essa tarefa, bem mais do que os seus antecessores, apostando na influência económica em detrimento da militar – exatamente aquilo que os talibãs precisam, agora que têm de governar um Estado dependente de ajuda externa – e mantendo uma estrita política de não-intervenção em assuntos domésticos de outros países.

O prémio para Pequim? «Aquilo que a China mais valoriza», resumiu Zhou Bo, investigador do Centro para Segurança Internacional e Estratégia da Universidade Tsinghua e antigo coronel do Exército de Libertação Popular, num artigo de opinião no New York Times. Ou seja, «oportunidades na construção de infraestrutura  ou indústria – áreas em que as capacidades da China provavelmente são incomparáveis – e acesso a um bilião de dólares em depósitos minerais inexplorados».

E não se tratam de uns recursos quaisquer. Entre os tesouros que ninguém conseguiu extrair do solo afegão, face a décadas e décadas de guerra ininterrupta, estão talvez as maiores reservas do mundo de lítio, um mineral raro, essencial para a produção de baterias E e, como tal, para o futuro da produção tecnológica, seja de veículos elétricos ou smartphones.

Não é de espantar que a China tenha já prometido que manterá a sua embaixada em Cabul aberta, como afirmou um porta-voz dos talibãs ao Guardian, esta sexta-feira,  e que reforçará a sua relação com o Afeganistão, aumentando a sua ajuda humanitária ao país. As esperanças dos países ocidentais de influenciar os talibãs através de pressão económica dependem em muito de quanto é que Pequim – assim como Moscovo, Islamabade ou Teerão – estará disponível para ajudar o novo regime.

Contudo, os talibãs já se mostraram bem seguros que podem contar com a  generosidade chinesa. «A China é o nosso mais importante parceiro», garantiu um porta-voz talibã, Zabihullah Mujahid, ao jornal italiano La Repubblica. «Representa uma oportunidade extraordinária e fundamental para nós, porque está pronta a investir e reconstruir o nosso país». 

É que estabilidade do Afeganistão, pela sua própria condição histórica de encruzilhada entre impérios, de ponto de passagem entre o Oriente e o Ocidente, é essencial para a segurança do maior projeto de infraestrutura chinês e da história da humanidade: a Nova Rota da Seda, que tenta ligar a China à Europa e a África através de uma rede de estradas, linhas de comboio de alta velocidade e portos, isolando os Estados Unidos.

Aliás, ainda em julho, um projeto de construção de uma  central hidroelétrica em Dasu, no norte do Paquistão, um dos principais parceiros da Nova Rota da Seda, foi alvo de um ataque, quando um autocarro cheio de trabalhadores e engenheiros foi atingido por um carro bomba, matando 14 pessoas, incluindo nove cidadãos chineses. Islamabade declarou que o ataque fora planeado a partir do Afeganistão, com apoio das secretas da Índia – amargo rival do Paquistão – e do caído Governo afegão.

Certamente que Pequim sentirá os seus investimentos mais seguros com outro Governo no poder no Afeganistão.