Três meses depois da morte de Nuno Santos, a 18 de junho, após ser atropelado por um carro que transportava o ministro da Administração Interna, a família ainda não conseguiu que fosse feita justiça, tendo como meio de subsistência uma pensão provisória da seguradora da empresa em que a vítima mortal trabalhava.
«Houve uma tentativa para alijar responsabilidades, até porque o primeiro comunicado oficial do Ministério (MAI) foi uma tentativa de culpabilizar o Nuno», começa por explicar José Joaquim Barros, advogado da família do chefe da equipa que realizava os trabalhos de manutenção e limpeza a cargo da empresa Arquijardim, em declarações ao Nascer do SOL. Sabe-se que o funcionário estava a iniciar o atravessamento da estrada depois de ter ido buscar sinalização ao separador central quando foi atropelado mortalmente ao km 77,6 da A6.
«O inquérito pode demorar muito tempo. Seis meses depois do segredo de justiça ser declarado, deve ser levantado. Mas há uma regra que prevê que possa ser prorrogado por três meses», diz o advogado, adiantando que «há um acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que indica que esses três meses não constituem uma regra fixa, mas sim só indicativa», explicando que tal se trata do uniformizador de jurisprudência, que corresponde aos antigos assentos.
«Estou permanentemente em contacto com a família do Nuno e aguardo o dia em que estarão reunidas as condições necessárias para pedir o levantamento do segredo de justiça», clarifica o profissional, admitindo que não se surpreende com a forma como o MAI reagiu perante o sucedido por ter acompanhado outras intervenções que o deixaram igualmente insatisfeito. «Ainda há uns dias, viu-se como Eduardo Cabrita reagiu aos festejos do Sporting. E não há nenhum deputado que lhe diga que ele validou a organização do evento. É de facto espantoso. Aquele homem sobrevive a tudo».
Apesar de o ministro se ter remetido maioritariamente ao silêncio quando era questionado acerca do acidente, à entrada do congresso do PS, no final de agosto, disse que «ao contrário de outros», nunca pressionou «uma investigação judicial», insinuando que a demora na atribuição de responsabilidade não é culpa sua. No entanto, segundo José Joaquim Barros, a viúva – de 41 anos – e as filhas do casal – de 15 e 19 anos – não se resignam.
«Que eu tenha conhecimento, o senhor ministro disse que terá pedido a uma assistente para ligar à família. Na altura do funeral, mandou dois senhores guardas entregar uma coroa de flores. Nunca foi nada pessoal. Aliás, este senhor ministro tem sempre razão. O partido dele tem sempre razão», atira o advogado, deixando claro que, independentemente daquilo que seja dito publicamente pelo MAI e pelo Governo, lutará para que a morte de Nuno não tenha ocorrido em vão.
«O motorista não foi constituído arguido sequer, não foi condenado a nada. Vou esforçar-me para que sejam constituídos arguidos ele e o senhor ministro», declara, sendo que o primeiro é um civil contratado pelo gabinete ministerial e não um agente da PSP ou militar da GNR. «O que é o segredo de justiça no caso de um acidente de viação?», pergunta José Joaquim Barros. «Mesmo o senhor primeiro-ministro disse que não compreendia o alarido porque Cabrita ia no banco de trás e não tinha nada a ver com aquilo que aconteceu. A lei diz que quem tem a culpa é quem tem a viação, quem controla o volante», critica. Em entrevista à SIC, no final de agosto, António Costa defendeu Eduardo Cabrita, dizendo ser «das coisas mais revoltantes e desprezíveis» a forma como se «tem aproveitado para atacar politicamente um ministro».
«Os tribunais são o último grito dos cidadãos»
«A situação é dramática. A família ainda está traumatizada. A seguradora do trabalho tem-se portado bem e a família recebe apoio psicológico para além da pensão provisória que a seguradora Caravela está a pagar sem ter havido um acordo», esclarece a defesa da família, adiantando que «se sancionamos quem age mal, devemos falar também de quem tem um bom comportamento».
«A filha mais velha é assistente no processo e a manutenção desta situação é uma violação flagrante do seu estatuto porque tem o direito e o dever de requerer provas, conhecer os despachos, etc. E é evidente que desde que ela não tem acesso ao processo, não pode fazer nada», elucida, adicionando que num processo penal podem ser constituídas assistentes, entre outras, as pessoas ofendidas ou os seus descendentes ou representantes legais.
«A Justiça ou é feita a tempo e horas ou nunca é Justiça. E, neste caso, com a opacidade política do senhor ministro e do Governo, os tribunais tinham uma ótima ocasião para colocarem em ação a sua transparência. Os tribunais são o último grito dos cidadãos», realça, acrescentando que os mesmos são um órgão de soberania porque «toda a vida atuaram de forma transparente para que a própria sociedade possa sindicar a sua atividade» e é exatamente por esse motivo que os julgamentos e os inquérito são de cariz público.
«Graças a Deus, a viúva é uma cliente que confia em nós e está disposta a fazer tudo aquilo que seja necessário», afirma. «Estou a fazer várias diligências que não posso revelar, mas esperemos que haja novidades em breve».